O dia em que um representante
da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) de São Paulo lembrou a um
apresentador do noticiário matutino da maior rede de TV brasileira que existe
telejornalismo informativo
Por Débora Cristine Rocha, no Observatório da Imprensa
O apresentador
do Bom
Dia São Paulo entrevista
ao vivo o representante da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), que
administra o trânsito no município de São Paulo. O entrevistado afirma que o
índice de congestionamento na cidade diminuiu. Mas o apresentador rebate e usa
o seguinte argumento: “É a minha opinião, eu acho que não diminuiu e cada um
tem a sua opinião.” Segue dizendo que a resposta da CET é a opinião da CET,
muita gente tem outra opinião.
Aí acontece
algo do outro mundo. O entrevistado toma a palavra novamente e diz que não se
trata de opinião, não. A CET tem dados que mostram a diminuição dos índices de
congestionamento na cidade de São Paulo. Há medições. Os números resultantes
destas medições foram obtidos por uma empresa de fora do Brasil por meio de
GPS. Explica como o trabalho é feito e arremata: “Então, não é uma questão de
opinião.”
Ora, ora. O
entrevistado acaba de lembrar a um apresentador do noticiário matutino da maior
rede de TV brasileira que existe telejornalismo informativo. Ora, ora. O
entrevistado acaba de lembrar a um jornalista que telejornalismo informativo se
faz com informações, dados, medições de GPS e coisas do tipo. Numa palavra, com
objetividade. Ora, ora. O entrevistado abre um sorriso de orelha a orelha no ar
e diz textualmente: “Não é uma questão de opinião.” O cara está feliz, ele sabe
do que está falando, domina o assunto e enfrenta o jornalista com a maior
tranquilidade.
Pois é,
apresentar telejornal preparado apenas com a própria opinião, aliás sem
embasamento, dá nisso. Qual seria a saída? No telejornalismo informativo
clássico, uma saída seria confrontar a fonte especializada com outra fonte
especializada. E sempre fazer a lição de casa para não deixar uma única fonte,
ainda mais oficial, falar sozinha no ar.
Info-entretenimento mascara a falta de profissionalismo
A gente
aprende como levantar outras fontes, fontes especializadas independentes sobre
o mesmo assunto, nos primeiros passos de qualquer curso de telejornalismo
sério. Mas o que acontece é que estamos deixando de lado as regras básicas de
como fazer o bom telejornalismo, e também o bom jornalismo em geral, porque
queremos ficar próximos do entretenimento.
Só que
desconfio deste argumento fácil. Porque até para fazer entretenimento é preciso
fazer um trabalho sério. Ou alguém vai dizer que o entretenimento também não é
uma indústria? Olha que Walt Disney vai se revirar no túmulo.
Acontece que o
info-entretenimento é uma palavra que está sendo usada para, na verdade,
mascarar a falta de profissionalismo. E isso desqualifica não apenas o
jornalismo, mas também o sério mundo do entretenimento, que movimenta bilhões
de dólares todos os anos.
***
Débora Cristine Rocha é jornalista,
professora doutora em Comunicação e Semiótica, docente da Universidade Anhembi
Morumbi
Foto de capa: Reprodução
Fonte: Revista Fórum
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