ELEIÇÕES 2022: MOVIMENTO 65

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domingo, 19 de agosto de 2018

Lula-ONU: Temer presidia Câmara quando país transformou pacto em lei

 

Ricardo Stuckert

Governo Temer já reconheceu a legitimidade do processo que Lula move no Comitê de Direitos Humanos da ONU contra a Lava Jato. Não faz sentido, agora, não reconhecer a legitimidade de um produto desse mesmo processo, que é a liminar que garante o petista na Eleição 2018.


O hoje presidente da República Michel Temer era comandante da Câmara dos Deputados no ano em que o Protocolo Facultativo ao Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos foi internalizado pelo Brasil, ou seja, virou lei a partir do momento em que o Congresso Nacional publicou o Decreto Legislativo 311, em 2009. Naquela época, o presidente do Senado era José Sarney.

O processo de integração de uma norma internacional ao direito interno acontece em duas etapas principais: primeiro é preciso que o Estado celebre um tratado, e a competência exclusiva para isso é da Presidência da República. Depois, cabe ao Congresso Nacional referendar a decisão do Executivo aprovando um decreto legislativo. É com a publicação do decreto que o Congresso confirma, "perante a ordem internacional, que o Estado se obriga perante o pacto que foi firmado."

Hoje, o governo Temer, por meio do Itamaraty e do Ministério da Justiça, rebaixa uma liminar concedida em favor de Lula pelo Comitê de Direitos Humanos das Nações Unidas, alegando que a comunicação que mandou garantir o petista na eleição 2018 tem caráter de "recomendação" e não de decisão judicial. Na visão da defesa de Lula, essa atitude mostra desconhecimento da equipe atual do Ministério das Relações Exteriores sobre os tratados dos quais o Brasil é signatário.

Quando transformou os termos do Protocolo ao Pacto em lei no Brasil, em 2009, o Congresso expressamente deu poder ao Comitê de Direitos Humanos da ONU para julgar processos solicitados por brasileiros que alegam violações de direitos em solo nacional.

Diz o Decreto que, "para melhorar atender os propósitos do Pacto Internacional" e a "implementação de suas disposições", o Comitê de Direitos Humanos da ONU foi "habilitado" para "receber e examinar, como se prevê no presente Protocolo, as comunicações provenientes de indivíduos que se considerem vítimas de uma violação dos direitos enunciados no Pacto."

Lula lançou mão desse direito em 2016, entrando no Comitê de Direitos Humanos da ONU com uma reclamação acerca do tratamento parcial que tem recebido dos tribunais brasileiros no âmbito da Lava Jato.

O governo Temer já foi notificado da existência desse processo no Comitê e, intimado a enviar uma resposta prévia das partes envolvidas, fez a defesa das ações da força-tarefa contra Lula sem questionar, em nenhum momento, a legitimidade do Comitê para processar a reclamação contra o Estado Brasileiro.

A liminar concedida a Lula no dia 17 de agosto se deu justamente no âmbito desse processo que está no Comitê da ONU, garantido pelo Decreto legislativo 311/2009. 

Se o governo Temer reconheceu a legitimidade do processo, não faz sentido não reconhecer a legitimidade de um produto desse mesmo processo, que é a liminar.

O Comitê da ONU só vai julgar o caso de Lula, no mérito, no próximo ano. Mas será uma violação irreparável aos direitos políticos do ex-presidente se ele for excluído da eleição sem ter tido direito ao "trânsito em julgado justo". Foi por isso que o Comitê recomendou ao Estado Brasileiro que tome as "medidas necessárias" para garantir sua participação na disputa, mesmo que ele permaneça preso em Curitiba.

"Quando, em 2009, o Brasil subscreveu o Protocolo opcional (do Pacto), se obrigou a cumprir as decisões da ONU. Não é mera recomendação, é preciso levar a quem escreveu [a nota do Itamaraty] esse Decreto Legislativo", sugeriu o advogado de Lula Cristiano Zanin.

É fato que a ONU não vai mandar tropas ao Brasil se a liminar não for cumprida. Mas rebaixá-la à condição de "mera recomendação" e desqualificar o Comitê de Direitos Humanos alegando que seus membros decidem de maneira pessoal, e não técnica, é diversionismo. "Mostra a que ponto chegou o Itamaraty [sob o governo Temer]", disse o ex-ministro das Relações Exteriores Celso Amorim. 


 Fonte: GGN

Serviços secretos mapearam primeiros passos de Haddad na política

 

Em reportagem publicada neste domingo (19), no Metrópoles, o jornalista Eumano Silva revela documentos confidenciais produzidos por órgãos de espionagem envolvendo o candidato a vice-presidente na chapa do ex-presidente Lula, Fernando Haddad. Então aluno da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, em 1984, Haddad teve seus primeiros passos na política acompanhados pela ditadura. 


O Brasil avançava rumo à redemocratização quando Fernando Haddad começou a participar do movimento estudantil da Universidade de São Paulo (USP). Aluno da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, o jovem filho de comerciante elegeu-se, em outubro de 1984, presidente do Centro Acadêmico XI de Agosto. Documentos confidenciais produzidos por órgãos de espionagem mostram que a ditadura acompanhou, nessa época, os primeiros movimentos públicos do paulistano que, em 2018, concorre na disputa presidencial pelo PT.

Nos acervos militares, Haddad aparece como um estudante envolvido nos debates nacionais e cercado de personagens da elite intelectual e política de São Paulo. Emerge, também, como um engajado militante petista.

O Metrópoles obteve no Arquivo Nacional de Brasília os registros militares sobre a atuação política de Haddad. Alguns relatórios foram produzidos depois do fim da ditadura, nos primeiros anos do governo José Sarney (1985-1989). Nas últimas semanas, o portal publicou papéis semelhantes relativos à militância da candidata a presidente da República pela Rede, Marina Silva, no movimento estudantil, no Partido Revolucionário Comunista (PRC) e durante uma greve de professores.

No caso do petista, os documentos limitaram-se à atuação no meio universitário. Produzido pela agência de São Paulo do Serviço Nacional de Informações (SNI), o Informe nº 616/140/ASP/85 trata das “eleições para renovação dos centros acadêmicos”. Faz referência, especificamente, à chapa “The Pravda”, presidida por Fernando Haddad, vencedora na disputa pelo XI de Agosto, tradicional entidade representativa dos estudantes de Direito.

Resultado da fusão dos títulos “The New York Times” e “Pravda”, o nome escolhido pelo grupo foi uma brincadeira com os nomes dos jornais dos Estados Unidos e da União Soviética, respectivamente. O relatório do SNI tem data de 25 de abril de 1985, seis meses depois da eleição para o XI de Agosto, e tinha como destino o IV Comando Aéreo Regional (IV Comar), de São Paulo.

Com o título “Campanha pela convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte (ANC)”, um relatório confidencial de duas páginas, sem timbre nem data, aborda a realização no dia 30 de janeiro de 1985 de um ato público com cerca de 800 pessoas no Largo de São Francisco.

Quatro entidades ligadas ao mundo do direito promoveram o encontro: Centro Acadêmico XI de Agosto, Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP), seção de São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e Associação dos Advogados de São Paulo.

Representante do XI de Agosto, Fernando Haddad foi um dos organizadores do ato. O encontro reuniu alguns dos personagens da linha de frente da luta pela redemocratização. Futuro ministro da Justiça no governo de Luiz Inácio da Silva, Márcio Thomaz Bastos falou em nome da seção de São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil.

Pelo Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP) pronunciou-se o jurista Ives Gandra Martins, pai do atual ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que herdou o mesmo nome. Junto com Thomaz Bastos, o estudante acendeu uma pira simbólica que deveria ser apagada apenas quando fosse feita a leitura de uma nova Constituição brasileira.

De acordo com o relatório confidencial, os oradores foram “unânimes” na defesa da convocação da Constituinte e do rompimento com o Fundo Monetário Internacional (FMI). Também pregaram a legalização dos partidos clandestinos, a participação do povo na elaboração da nova Carta Magna e o fim do autoritarismo. Entre os que se posicionaram estava Haddad.

Na data do ato na USP, os brasileiros tinham razões para acreditar que a ditadura chegava ao fim. Duas semanas antes, no dia 15 de janeiro de 1985, o Colégio Eleitoral escolhera em eleição indireta o ex-governador de Minas Gerais, Tancredo Neves, para a Presidência da República. O veterano político mineiro era o primeiro civil – e oposicionista – escolhido para comandar o país depois de duas décadas de governos militares.

Com Tancredo impedido de tomar posse por graves problemas de saúde, o vice da chapa, José Sarney, assumiu no Palácio do Planalto no dia 15 de março de 1985. Permaneceu no cargo, após a morte do presidente em abril, por cinco anos. No seu governo, convocou a Assembleia Nacional Constituinte, presidida pelo deputado Ulysses Guimarães. A nova Carta Magna foi promulgada no dia 5 de outubro de 1988.

Outros nomes de destaque na resistência política estavam presentes no ato, como o bispo de Caxias (RJ), d. Mauro Morelli. José Gregori, na época deputado estadual pelo MDB, e com longa trajetória na defesa dos Direitos Humanos e de presos políticos. Chegou a ministro da Justiça no governo Fernando Henrique Cardoso.

Ex-guerrilheiro do PCdoB no Araguaia, José Genoino estava no primeiro dos cinco mandatos consecutivos de deputado federal pelo PT. É identificado pelo documento como militante do clandestino Partido Revolucionário Comunista (PCR). Eduardo Suplicy, futuro senador petista, era deputado federal.

Ainda desconhecido na política nacional, um dos presentes iniciava uma trajetória vitoriosa e, nos últimos anos, controversa. O atual presidente do Brasil, empossado depois do impeachment de Dilma Rousseff, aparece no documento militar com o nome completo: Michel Miguel Elias Temer Lulia. Também formado no Largo de São Francisco, ele era na ocasião secretário estadual de Segurança Pública no governo de André Franco Montoro.

Propostas apresentadas no dia por diferentes segmentos da sociedade foram anexadas pelos militares ao relatório sobre o ato público. Os arquivos militares preservaram panfletos assinados pela Convergência Socialista, corrente política que deu origem ao atual PSTU, pelo Movimento Negro Pró-Constituinte, pelo PT de São Paulo, por movimentos ecológicos e por uma associação de vigilantes.

Outro relatório arquivado pelos militares aponta a participação de Fernando Haddad nos preparativos para a Assembleia Nacional Constituinte. Assim como no caso do documento anterior, por não ter cabeçalho nem timbre, não se pode determinar o órgão que o produziu.

Do sistema de informações do governos dos generais faziam parte estruturas militares, como serviços secretos das Forças Armadas, como de instituições civis, a exemplo da Polícia Federal. Com duas páginas, intitula-se “Plenário Pró-Participação Popular na Constituinte”.

Segundo o relato, esse fórum contava com 130 entidades e realizou, na noite do dia 22 de agosto de 1985, mais um ato público no Largo de São Francisco. Como aconteceu no caso a Marina Silva, os agentes secretos continuaram investigando as forças políticas atuantes no ambiente frequentado por Haddad mesmo depois do fim da ditadura.

Entre as cerca de 300 pessoas presentes neste ato, estavam Haddad e personalidades como o então deputado federal Plínio de Arruda Sampaio (PT-SP), morto em 2014, a futura prefeita de São Paulo Luiza Erundina, também pelo PT, e novamente Eduardo Suplicy e Márcio Thomaz Bastos.

Uma nota produzida pelo plenário comunica o envio ao Congresso de uma subemenda à emenda de convocação da Constituinte apresentada por Sarney.

O perfil do grupo político, mais fechado, integrado pelo jovem Fernando Haddad fica mais explícito no documento “Contribuição ao Encontro Nacional dos Estudantes do PT”, elaborado por 62 líderes universitários reunidos em Juiz de Fora (MG) em 6 de abril de 1985. O texto foi assinado por representes de entidades de Minas Gerais, São Paulo e Goiás. Entre eles estava o presidente do Centro Acadêmico XI de Agosto. Os serviços secretos apreenderam uma cópia.

Autodenominados “Articulação independente”, os signatários se propõem a construir, dentro do partido, uma alternativa a grupos internos chamados de “revolucionários do PT”. São classificados de “doutrinários e aparelhistas” pelos participantes do encontro em Juiz de Fora. Essa é uma referência indireta às correntes petistas, remanescentes da luta contra a ditadura, e que disputavam o poder no movimento estudantil.

A crítica se dirigia, por exemplo, aos militantes do PRC e às tendências trotskistas Liberdade e Luta (Libelu) e Convergência Socialista, precursora do PSTU. As forças do movimento estudantil fora do PT foram acusadas de agir por “interesses próprios, em detrimento das necessidades dos estudantes”.

Nesse caso, as citações apontam diretamente para o Partido Comunista do Brasil (PCdoB), hegemônico no comando da União Nacional dos Estudantes (UNE) desde a reconstrução da entidade, em 1979, o Partido Comunista Brasileiro e o Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8). Essas organizações são tratadas como responsáveis pelo esvaziamento das atividades políticas estudantis.

O grupo reunido em Juiz de Fora ficou conhecido pelas outras tendências como “PT independente” ou “PT PT”. Com o tempo, integrou-se à Articulação, corrente petista liderada por Lula e composta, majoritariamente, por sindicalistas e militantes ligados à Igreja Católica.

Com novos arranjos internos, essas mesmas forças mais tarde assumiram a denominação de Campo Majoritário e, depois, de Construindo um Novo Brasil (CNB), nome adotado até os dias de hoje.

A 2ª Seção do I Exército em Belo Horizonte, órgão de informação da Força Terrestre, também registrou o encontro de Juiz de Fora. O Informe nº 302/85/T-14/4ª DE tem como assunto “Atividades dos estudantes petistas” e identifica a realização de encontros municipais em seis cidades de Minas Gerais.

Como presidente do XI de Agosto, Haddad entrou para a linha de frente do movimento estudantil paulista. Berço político do petista, o XI de Agosto é o mais tradicional centro acadêmico do país. Fundado em 1903, teve entre seus membros personagens relevantes da história do país, como o presidente da Constituinte, Ulysses Guimarães, o escritor Monteiro Lobato, o presidente da República Jânio Quadros e os juristas Dalmo Dalari e Miguel Reale. O atual ministro das Relações Exteriores, Aloysio Nunes Ferreira Filho, foi presidente da entidade em 1967.

A atuação do jovem estudante no Largo de São Francisco impressionou, logo de início, os veteranos do curso de Direito. Jornalista e professor titular da Escola de Comunicação e Artes da USP, Eugênio Bucci foi o antecessor de Haddad na presidência do XI de Agosto. Guarda na lembrança a imagem de um rapaz que impressionou os mais antigos pelo interesse em colaborar com o centro acadêmico e, também, pelo tino administrativo.

Rapidamente, o descendente de libaneses passou a cuidar das finanças da entidade e, na sucessão de Bucci, surgiu como nome natural. “Ele era um estudante disciplinado, inteligente e tinha uma visão clara do que ia fazer”, diz o professor. “Estudava, militava e trabalhava na loja do pai. Com essa experiência no comércio, Fernando Haddad aprendeu a fazer uma espécie de radiografia dos interlocutores”, acrescenta o colega de faculdade do petista. Nessa mesma época, ele filiou-se ao PT.

A facilidade com administração manteve Haddad próximo dos amigos do XI de Agosto. Ele cuidou, por exemplo, da assinatura da revista Teoria e Debate, editada por Bucci, que chegou a 25 mil exemplares. Terminado o curso de direito, o passo seguinte foi o mestrado em Economia na USP e, depois, o doutorado em Filosofia.

O professor guardou na memória o esforço do amigo: “Era muito difícil para alguém que não fosse economista ser aprovado, mas ele levou pilhas de livro para a sobreloja do estabelecimento do pai e conseguiu”.

Passados 34 anos da eleição para a presidência do centro acadêmico, Haddad compõe a chapa presidencial do PT. Nesse tempo, dedicou-se à vida acadêmica, foi ministro da Educação e prefeito de São Paulo. No momento, é candidato a vice de Lula, preso em Curitiba em decorrência da Operação Lava Jato.

Se for confirmada a impugnação do líder petista, por causa de Lei da Ficha Limpa, o ex-presidente do XI de agosto assumirá a candidatura ao Planalto. Na hipótese de chegar ao comando do país, poderá provar se a capacidade administrativa detectada pelos colegas continua aguçada. 


 Fonte: Metrópoles

Brasil é um grande paraíso fiscal para os mais ricos

 

Especialistas discutem qual a reforma tributária que o país realmente precisa para a cobrança de impostos ser mais justa.


A atual lógica de tributação no Brasil precisa ser invertida para se cobrar mais impostos sobre renda e patrimônio, e menos sobre o consumo. Do jeito que está hoje, os mais pobres são penalizados, enquanto os mais ricos concentram riqueza ano após ano. Especialistas em tributação, reunidos em Porto Alegre para o lançamento do livro A Reforma Tributária Necessária - Diagnósticos e Premissas, analisaram a situação brasileira durante o evento realizado na terça-feira (14) e sugeriram algumas medidas urgentes para que o Brasil possa reduzir a imensa desigualdade que condena milhões de pessoas à pobreza.

O livro, que pode ser baixo daqui (arquivos em PDF), conta com a contribuição de 42 especialistas e foi elaborado pela Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital (Fenafisco) e pela Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Previdência Social (Anfip).

Os autores sugerem que a reforma tributária no Brasil seja pautada por oito premissas:

1- Ser pensada na perspectiva do desenvolvimento;

2- Ser adequada para fortalecer o Estado de Bem-estar Social;

3- Promover sua progressividade pela ampliação da tributação direta (tributação da renda das pessoas físicas e das pessoas jurídicas; tributação internacional para combater a evasão e os paraísos fiscais; tributação das transações financeiras; e tributação da propriedade e a riqueza;

4- Promover sua progressividade pela redução da tributação indireta;

5- Restabelecer as bases do equilíbrio federativo;

6- Considerar uma tributação ambiental;

7- Aperfeiçoamento da tributação sobre o comércio internacional;

8- Fomentar ações que resultem no aumento das receitas, sem aumentar a carga, pela revisão das renúncias fiscais e pelo combate à evasão fiscal.

Um segundo livro será lançado ainda este ano com sugestões de medidas para se aumentar a tributação da renda, patrimônio e transações financeiras no país. Desta maneira, estimam os economistas, seria possível aumentar a arrecadação brasileira em R$ 400 bilhões. Por outro lado, haveria cortes de impostos sobre o consumo e folha salarial da ordem de R$ 280 bilhões.

Leia o posicionamento de alguns dos especialistas que contribuíram com o livro:

Rafael Georges, coordenador de campanhas da Oxfam Brasil

Uma reforma tributária progressiva é a principal e mais urgente medida que pode ser tomada para a redução da desigualdade no Brasil. O enfrentamento da desigualdade passa, ainda, pela revogação do Teto de Gastos (Emenda Constitucional 95) do governo federal, que cria uma competição entre gastos sociais; a revogação de partes da reforma trabalhista, que colaboram para a precarização da condição dos trabalhadores; e uma forte agenda de investimentos em educação.

É preciso ainda enfrentar as desigualdades de natureza discriminatória, como o fato de mulheres e negros receberem abaixo do que ganham os homens brancos no Brasil, nas mesmas condições. A mulher chega em determinado nível da sua carreira ou da sua trajetória e não consegue ganhar mais, porque ela tem que cuidar dos filhos, seja ela de classe média, baixa ou alta. Ela fica em casa, reduz sua renda e tem menos poder.

Quanto aos negros, toda hora que você vai tentar explicar, seja porque os negros têm menos estudo, seja porque têm menos acesso à universidade, conforme você vai confrontando esses dados, chega-se à mesma conclusão: há diferenças que só o racismo explica. Um médico negro ganhar 80% do que ganha um médico branco, só o racismo explica. Ninguém admite o racismo, mas ele está aí.

A gente tem que assumir isso de uma vez: sim, o Brasil é racista, e vamos fazer políticas para corrigir essa anormalidade histórica.

Eduardo Fagnani, professor da Unicamp e coordenador dos trabalhos de elaboração do livro

O objetivo é subsidiar e fomentar a discussão sobre o sistema tributário brasileiro, ao mesmo tempo que se contrapõe a uma visão que vem sendo defendida há mais de duas décadas: que a reforma tributária deve focar na simplificação de impostos.

Qual o problema disso? É que não enfrenta a questão crucial, que é a desigualdade. A segunda questão crucial é que, quando você acaba com várias contribuições e cria uma só, o IVA (impostos sobre valor agregado), essas contribuições são constitucionalmente vinculadas ao financiamento da Previdência Social, então você acaba com o financiamento da proteção social. Além de não enfrentar o problema da desigualdade, você acaba com a proteção social.

Se somadas, as isenções fiscais concedidas hoje pela União (cerca de R$ 370 bilhões) e a sonegação tributária (cerca de R$ 500 bilhões), o valor que o Brasil deixa de arrecadar com impostos se aproxima dos R$ 900 bilhões, isso sem contar que estados e municípios também concedem benefícios fiscais.

Para efeito de comparação, todos os entes federativos somados arrecadaram R$ 2,2 trilhões em impostos em 2017. O que se deixa de arrecadar corresponde a 65% da receita tributária federal e a 50% da receita tributária se você somar União, estados e municípios.

Na questão do imposto de renda, por exemplo, a sugestão é que pessoas com renda de até quatro salários mínimos sejam isentas do IR, adote-se alíquotas progressivas para quem receber entre 5 e 25 salários mínimos, a manutenção da alíquota maior atual (27,5%) para quem recebe até 40 salários mínimos, uma nova tarifa de 35% para quem ganha entre 40 e 60 salários mínimos e uma outra de 40% para aqueles com vencimentos acima de 60 salários mínimos. Isso ainda muito abaixo dos países europeus, alguns deles chegam até a 60%. Mas, se você fizer isso, uma coisa que vai penalizar somente 750 mil declarantes num total de 27 milhões, que vão pagar mais imposto, você pode ter um aumento de quase R$ 180 bilhões.

A ideia é reduzir a participação dos impostos sobre o consumo na arrecadação total dos atuais 50% para a casa dos 35%, próximo da média da OCDE (34%) e, mesmo aumentando a tributação sobre a renda, ainda manter a carga tributária geral do país abaixo dos 35% do PIB, que é a média da OCDE (hoje está na casa dos 32%).

Pedro Lopes Araújo Neto, mestre em Contabilidade, professor de Ciências Contábeis e auditor fiscal do Tesouro do Estado do Rio Grande do Norte

A percepção de que a carga tributária brasileira é alta não deixa de ser verdadeira, mas isso acontece pelo fato de que, na comparação com os países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Brasil - que ainda não é membro da entidade - seria o segundo que mais tributa bens e serviços.

Por outro lado, diferentemente dos países desenvolvidos, não taxa lucros e dividendos, e mesmo os impostos sobre a renda são mais baixos do que a média. Quem paga imposto de renda no Brasil é a classe média assalariada. Os empresários pagam muito pouco imposto.

Até mesmo os Estados Unidos, que sempre é citado como país de baixos impostos, tributa em até 50% a renda e o patrimônio dos seus contribuintes. O Brasil tem uma fórmula inversa, cobrando muito pouco da renda, cobrando muito do consumo. Se o empresário não paga, quem vai pagar é o trabalhador.

Jorge Abrahão, professor e ex-economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea)

Não existe uma fórmula secreta que determina que se deve taxar mais a renda do que o consumo, mas ao se observar as experiência internacionais dos países que têm menos desigualdades, verifica-se que eles adotam modelos mais progressivos e justos de tributação.

Em Ciências Sociais e em Economia, é importante a gente ver os casos de maior sucesso. Neles, há de fato um equilíbrio entre imposto de renda e tributação sob consumo. Tentar baixar um pouco o imposto sobre o consumo e ampliar sobre a renda, acho que esse é um elemento. Grande parte da população brasileira nem percebe que paga imposto. Principalmente os mais pobres, e estamos falando de 80% da população, não chega nem a pagar imposto de renda.

Mas sobre cada produto que ela compra, paga imposto, só que isso ela não percebe. A ideia de que a gente paga muito imposto é muito um discurso de quem paga pouco imposto. Aqueles que estão no topo da pirâmide, em termos relativos, a alíquota que recai sobre a renda deles é quase nula, mas eles têm um discurso de quem paga muito imposto.

É preciso voltar a se tributar lucros e dividendos, que passaram a ser isentos de impostos no Brasil em 1995. É inaceitável que isso continue, até porque esses lucros e dividendos não cumprem papel algum, a não ser para a especulação e permanência patrimonial de um conjunto muito pequeno da população brasileira. É preciso corrigir isso. 


 Fonte: RBA
Com o Portal Vermelho