ELEIÇÕES 2022: MOVIMENTO 65

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domingo, 24 de junho de 2018

ELEIÇÕES 2018: Manuela D’Ávila: “Meu desafio é conversar com os jovens que aderem ao discurso de ódio

Manuela D'Ávila é pré-candidata à Presidência pelo PCdoB
Manuela D'Ávila, em foto de divulgação. 

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Deputada será a primeira candidatura própria do PCdoB em sete eleições presidenciais.

Ela diz que a esquerda não corre riscos com várias candidaturas no primeiro turno.

eleição presidencial de 2018 deverá ser a disputa com o maior número de candidatos desde a eleição de Fernando Collor de Mello. Também promete ser a primeira, em décadas, a não ser marcada pela polarização PSDB X PT. E há ainda o risco de que o candidato mais bem sucedido nas pesquisas não possa, sequer, concorrer, já que Luiz Inácio Lula da Silva pode ser condenado em segunda instância e se tornar inelegível antes de a campanha começar. Foi neste cenário de caos eleitoral que o PCdoB resolveu se descolar do eterno aliado PT e lançar uma candidatura própria. Mas o voo solo não poderia ser com qualquer nome. Era necessário escolher alguém jovem, que pudesse dialogar com um público inclinado a ceder ao discurso autoritário de Jair Bolsonaro, um sucesso nas redes sociais. E uma mulher, que conseguisse balançar o principal segmento de votos de Marina Silva (REDE). Uma estratégia que pode levar o partido mais longe. E que, de quebra, ainda pode ajudar a diminuir os votos de dois dos principais rivais de Lula, deixando-o mais seguro rumo ao segundo turno, caso consiga disputar. 
Mas Manuela D'Ávila, a pré-candidata escolhida pelo PCdoB, faz questão de esclarecer: não se apresentará como candidatura auxiliar de ninguém. A decisão de seu partido de não apoiar o PT, pela primeira vez em sete eleições, está atrelada ao momento histórico do país, afirma ela. E, para a atual deputada estadual do Rio Grande do Sul, esta é a hora de a legenda demonstrar suas próprias ideias, que algumas vezes, ao longo dos anos, divergiram das do PT, ainda que para o público comum a posição dos dois muitas vezes parecessem se misturar. "A gente permaneceu por sete eleições com a candidatura petista. E foi um ciclo importante de mudança para o país. O golpe de 2016 [impeachment de Dilma Rousseff] rasgou os compromissos com aquilo que havia sido assumido com a população nas eleições. A partir desta quebra de conjuntura se abre um novo ciclo. E entendemos que era o momento de apresentar um nome próprio", destaca ela, em entrevista ao EL PAÍS. "A nossa decisão vem de uma análise do momento que o Brasil vive. Sempre tivemos um apoio crítico ao PT. Sempre fomos um outro partido, questionando a política macroeconômica, por exemplo. Com este novo ciclo que se abriu achamos que é hora de ter um interlocutor."
Mas não seria mais prudente, em um momento em que nomes mais conservadores como o de Bolsonaro aparecem com possibilidades reais de vitória, que a esquerda se unisse? "A gente acha que isso pode se dar no segundo turno. Acreditamos que [no primeiro turno] seria importante ter vários segmentos representados", diz. Ela rejeita o risco de que esta pulverização acabe levando votos que poderiam ser de Lula para o PCdoB ou para o PSOL, que flerta com a possibilidade de lançar como candidato Guilherme Boulos, líder do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), um perfil com apelo junto aos movimentos sociais, como Lula. "Não acredito que corremos este risco. Se ter mais de uma candidatura fosse um problema neste sentido, a direita não teria dez candidatos. Nós, da esquerda, também temos matizes distintos e queremos expor nossas ideias", ressalta ela, que tem viajado pelo país para ouvir a população e construir um plano de Governo, afirma. A posição é parecida com a defendida recentemente por Marcelo Freixo, deputado pelo PSOL, em entrevista à Folha de S.Paulo. Freixo, porém, fez críticas mais diretas ao PT e a Lula: "Se quisessem recompor a esquerda, não andariam de braços dados com Renan Calheiros em Alagoas."
Manuela rejeita que sua candidatura possa atrair uma esquerda desiludida com os escândalos de corrupção. "Acredito que pode atrair a esquerda renovada", ressalta, explicando que é o grupo dos eleitores que reconhece as transformações feitas pelos Governos petistas, mas quer mudanças. E não acha que o envolvimento com a corrupção de um partido apoiado por tanto tempo pelo PCdoB possa prejudicar sua candidatura. "Tenho 14 anos de vida pública. O que vale é a nossa prática. Minha biografia", ressalta ela.
Saída do movimento estudantil, Manuela se tornou em 2004, aos 23 anos, a vereadora mais jovem já eleita em Porto Alegre, sua cidade natal. Entre 2007 e 2014, exerceu o cargo de deputada federal e concorreu à prefeitura de Porto Alegre por duas vezes, até que em 2015 assumiu o cargo de deputada estadual. Em 2015, tornou-se mãe de Laura, que a acompanhou por diversas vezes em seu trabalho no Plenário. Defendeu seu direito de amamentar publicamente depois de escutar críticas quando uma foto sua, alimentando a filha, foi publicada no jornal Folha de S.Paulo, algo visto por um crítico como "exposição desnecessária da mama de uma deputada". 
Assim como Marina Silva, Manuela D'Ávila dá sinais de apelo entre as mulheres e os jovens, de acordo com a última pesquisa Datafolha. Mas é o contrário de Marina, uma evangélica que não se posiciona claramente quando a temas polêmicos caros para o movimento feminista. Seria possível, então, que sua candidatura retirasse votos da candidata da REDE e, com isso, beneficiasse indiretamente Lula? "Nunca li nenhuma pesquisa com esse olhar e jamais fiz essa avaliação", garante ela. "Sempre olhei com a possibilidade de disputar pessoas que, por razões muito concretas, como o medo da crise, transformam seus discursos em um discurso de ódio. Meu principal desafio é conversar com essas pessoas, esses jovens. Quero apresentar um projeto que discuta isso: que o tema da segurança pública não vai ser resolvido sem política pública", afirma. "Não tenho nenhum objetivo de ser auxiliar de nenhuma candidatura. Meu objetivo é fazer um debate para aquilo que serve para 95% da população. E temos que disputar esse tema da violência. Ao mesmo tempo que discutimos como a gente desenvolve esse país para negros, mulheres, gays e trabalhadores", diz.
"Me preocupa a existência de uma candidatura que só construa o ódio. [Um candidato] que fale que mulheres merecem ser estupradas", ressalta ela, citando uma frase de Bolsonaro para deputada do PT, Maria do Rosário ("Jamais iria estuprar você porque você não merece"). Um embate direto com um candidato polêmico, que, se colocado, pode levá-la a enfrentar uma gama de defensores fiéis —e muitas vezes agressivos— do deputado ex-militar. Mas ela diz não ter medo. "Já sofri a violência física. Já me atacaram grávida, quando minha filha tinha dois meses no colo. Não tive tempo para ter medo. Sei como eles agem."
Fonte: Brasil El País

Música - O Clube da Esquina e a amizade como laço da sociabilidade urbana



Dentre os eventos musicais e movimentos culturais situados entre os marcos da Bossa Nova e do Tropicalismo, um verdadeiro período de ruptura e renovação musical influenciado pelo ciclo de desenvolvimento nacional, o Clube da Esquina surge na década de 1960 em Belo Horizonte, Minas Gerais, como um movimento que trouxe inovações estéticas, porém sem encaixar-se por completo nos estanques musicais da Bossa Nova, Samba Canção, Tropicália, Jovem Guarda ou Canção Protesto.

Com Lô Borges, Beto Guedes, Toninho Horta, Fernando Brant, Wagner Tiso e, claro, o emblemático Milton Nascimento, sua figura central e idealizadora, e tantos outros, o Clube da Esquina, cunhado assim a duas mãos por Lô Borges e “Bituca”, apelido de Milton, era um grupo de amigos que se reunia para conversar sobre poema, música e cinema num boteco do bairro de Santa Teresa, situado na esquina da Rua Divinópolis com a Rua Paraisópolis.

Apesar de nunca ter sido entendido como um movimento musical, o grupo trouxe o que podemos chamar de world music, criando uma síntese culturalmente diversificada e densa que digeriu e aglutinou Jazz, Música Caipira, Nueva Trova Latino-americana e Beatles, sem falar da mistura de elementos progressivos com psicodelismo, Cantos Étnicos e Congado.

Portanto, distanciando-se não somente da Bossa Nova, já que os últimos consideravam a música rural obsoleta, mas também do tropicalismo, vez que os “esquinistas” se utilizavam da música rural e do balanço e da harmonia bossa-novistas em meio ao rock progressivo, como pode ser claramente visto nas canções “Para Lennon e McCartney” e “Um Girassol da Cor de Seu Cabelo”.




Em sua primeira fase, no período que compreende o final da década de 1960, como pode ser analisada nos álbuns “Travessia” (1967) e “Courage” (1968), a essência das letras constituía-se mais em elementos do Jazz e da Bossa Nova, assim, de forma bem menos diversificada do que em um segundo momento do grupo (1970-1973), no qual as composições dos seus integrantes começaram a incorporar não somente os elementos do rock progressivo inglês, mas tradições musicais e culturais dos andinos e cancioneiros mineiros, fase em que se consolida sua popular e genuína fusão de tendências estéticas.

Com uma sonoridade própria, nem tão coloquial quanto a Bossa, nem tão irreverente quanto o Tropicalismo, o Clube da Esquina foi o mais importante movimento musical da história recente de Minas Gerais. Valorizando suas raízes mineiras imprimidas de maneira singular nos antológicos álbuns “Clube da Esquina” (1972) e “Clube da Esquina II” (1978), sem pretender tal objetivo, seus integrantes conseguiram colocá-los como dois dos mais relevantes discos de todos os tempos da Música Popular Brasileira. O regionalismo de dentro para fora que enaltece as tradições mineiras pode ser visto na canção “Paisagem da Janela”, tratada com alguns dos requintados recursos harmônicos bossa-novistas.


Ao misturar o rural com o urbano, o local com o global, o movimento viu na música a sua arma mais pungente. Apesar de não explicitar seu engajamento como o fizeram Chico Buarque, João Bosco, Caetano Veloso, Gilberto Gil e Tom Zé, os integrantes do Clube da Esquina discretamente tendiam sempre à corrente cultural nacional-popular. De forma geral, como dito outrora, o grupo não optou por contrastar unicamente com elementos como o erudito, tradicional e nacional, mas também com o popular, o estrangeiro e a vanguarda, uma combinação e assimilação especialmente críticas da cultura vigente à época. 

Mesclando de forma recorrente temas como “viagem”, “estrada”, “mudança”, “amizade” e sentimentos como o de “tristeza” e “paz”, há uma clara carga histórica em suas composições. Boas perspectivas e a esperança de um país maior presentes nas letras, em sofisticada harmonia com a melodia, ressoam até hoje através das respectivas apresentações de seus integrantes. Sem citar diretamente a opressão e repressão do contexto social e político da Ditadura, a angústia e a preocupação marcam os seus recursos tímbricos e as suas densidades sonoras, num verdadeiro contraponto à alteração do modo de vida implementado pela sociedade capitalista e pelo referido período de exceção.

Tanta gente no meu rumo

Mas eu sempre vou só

Nessa terra desse jeito

Já não sei viver

Deixo tudo deixo nada

Só do tempo eu não posso me livrar

E ele corre para ter meu dia de morrer

Mas se eu tiro do lamento um novo canto

Outra vida vai nascer

Vou achar um novo amor

Vou morrer só quando for

– “Outubro”, Milton Nascimento e Fernando Brant (1968)

Portanto, com uma mineiridade que mais se parece com um manancial histórico do Estado de Minas, e exercendo um diálogo reflexivo e altamente criativo com a realidade sócio-política da época, o Clube da Esquina teve uma considerável importância no contexto cultural da Ditadura.

Destacando um momento particular da música brasileira, e tendo como ponto de partida os discos “Minas” e “Geraes”, ambos do cantor, compositor e violonista Milton Nascimento, através de um ambiente sonoro constituído por um saudosismo e “fé no povo” que “resiste e insiste” por uma saúde social, pode-se dizer que toda discografia do Clube da Esquina possui não somente a identidade cultural como marco fundamental, mas a amizade como sua principal fonte de inspiração poética.

Amigo é coisa para se guardar

No lado esquerdo do peito

Mesmo que o tempo e a distância digam “não”

Mesmo esquecendo a canção

O que importa é ouvir

A voz que vem do coração

Pois seja o que vier, venha o que vier

Qualquer dia, amigo, eu volto

A te encontrar

Qualquer dia, amigo, a gente vai se encontrar

– “Canção da América”, Milton Nascimento e Fernando Brant (1979)

Com um olhar dotado de uma dimensão política, ao tratar da amizade e do valor da união que surgiu dos encontros pelos cantos, becos, praças, bares e esquinas da cidade, o Clube da Esquina expressa em suas canções como o espaço urbano pode ser um local de construção das relações sociais e de troca de ideias e opiniões diversas diante do bem comum.

Influenciado pela topografia e fisionomia da cidade, portanto à mercê das transformações políticas, sociais e urbanísticas de Belo Horizonte, o grupo conseguiu, em torno da experiência de amizade, interação e diálogo, construir uma canção popular que reivindicasse a cidade enquanto espaço das liberdades humanas e do fortalecimento do espírito associativo, rompendo, então, com o esvaziamento da esfera pública.

Em um período que entregar-se ao mundo significava correr riscos, ao cobrir musicalmente desde a fazenda ao estádio de futebol, passando pelas estradas de terras periodicamente frequentadas pelos cancioneiros, o Clube da Esquina valorizou as tradições mineiras ressignificando os sentidos de como ocupar a cidade com alegria, emoção e criatividade.

Os sonhos não envelhecem!

Fonte: Disparada