ELEIÇÕES 2022: MOVIMENTO 65

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CAMPANHA MOVIMENTO 65

terça-feira, 15 de janeiro de 2019

Política Sou da Paz lança hoje campanha contra liberação de armas

 

Nesta terça (15), dia em que o presidente Jair Bolsonaro assina decreto para facilitar a posse de armas de fogo, o Instituto Sou da Paz lança nas redes sociais as primeiras campanhas contrárias à medida.


A entidade preparou duas peças. A primeira reforça a ideia de que só ricos poderão ter armas em casa. “Com o preço de uma pistola”, diz o Sou da Paz, é possível comprar uma geladeira, um fogão, uma máquina de lavar roupas, uma TV de 32 polegadas e um micro-ondas.

A segunda publicidade afirma que, ao facilitar o acesso a armas, o Planalto está repassando ao cidadão uma responsabilidade que, na verdade, é dele.

“Se você está doente, o governo não te pede para comprar um bisturi e se operar. Então por que se você sofre com o crime tem que se proteger sozinho?”, diz a campanha.

O Sou da Paz quer levar a ofensiva publicitária anti-armas para a televisão e para o rádio ainda em janeiro. O instituto acredita que a política adotada por Bolsonaro fará “o número alarmante de 43 mil homicídios anuais cometidos com armas de fogo crescer ainda mais”.


Nas redes sociais, a campanha está sendo divulgada com hashtag #NãoTáTudoBem

Feminicídio

Em entrevista para a revista Época, Stephanie Morin, gerente da área de Gestão do Conhecimento do Instituto Sou da Paz, alerta que há uma relação perigosa entre arma dentro de casa e o aumento de casos de feminicídio no Brasil: entre 2011 e 2016, disparos de arma de fogo foram a principal causa da morte de mulheres de até 29 anos de idade.

Segundo Morin, dar posse de armas às mulheres não vai fazer com que se sintam mais seguras, já que as armas têm de ser guardadas em locais de difícil acesso — inclusive para evitar o risco de serem pegas por crianças — e é bem difícil imaginar que, numa situação de briga corporal, uma mulher consiga se desvencilhar do agressor, pegar a arma e se defender. “Isso é uma falácia. A maior presença de armas traz desfecho trágico para brigas fúteis. Em ambientes conflituosos, de violência doméstica, o problema tende a se agravar. Provavelmente, as mulheres passarão a ser ainda mais ameaçadas. E quem vai usar é o opressor, não a vítima”, disse Morin. “A arma cria situações perigosas não só para os envolvidos, mas também para as pessoas que estão próximas”, completou.

Fonte: Portal Vermelho

100 anos da morte de Rosa Luxemburgo: a rosa vermelha do socialismo


 

Por Augusto C. Buonicore*


No dia 15 de janeiro se completam 100 anos do brutal assassinato da comunista polonesa Rosa Luxemburgo. Ela foi uma combatente de primeira hora contra o revisionismo teórico de Bernstein no interior da social-democracia. Condenou duramente o oportunismo de direita presente na direção do sindicalismo alemão, e defendeu a experiência da Revolução Russa de 1905, especialmente o uso da greve geral como instrumento importante na luta revolucionária. Quando se iniciou a Primeira Grande Guerra Mundial, ocorrendo a traição da maioria dos dirigentes da II Internacional, Rosa se colocou ao lado de Lênin em oposição à guerra imperialista e na defesa da revolução socialista europeia. Foi fundadora do grupo spartakista de onde surgiria o Partido Comunista da Alemanha. Após sua trágica morte, em 1919, no discurso de abertura do congresso de fundação da III Internacional, Lênin fez uma pungente homenagem à águia polonesa, heroína do proletariado mundial.

O ato final

Era 15 de janeiro de 1919 e as ruas de Berlim estavam tensas. Por toda parte viam-se os vestígios dos combates dos dias anteriores. As tropas do exército alemão e grupos paramilitares, os “corpos livres”, desfilavam imponentes pelas ruas da cidade morta.

A insurreição parecia ter chegado ao seu final. Uma batalha havia sido perdida, mas não a guerra. Assim pensavam Rosa e Karl Liebknecht, quando foram sequestrados e levados ao Hotel Éden para averiguações. De lá deveriam seguir para a prisão, onde se encontravam centenas de operários revolucionários. Contudo, o cortejo faria outro caminho, que não era o da prisão nem o do exílio. A burguesia e os generais alemães já haviam decretado a sentença. Os dois foram conduzidos ao zoológico municipal onde terminariam assassinados. Decerto, alguém se perguntava: “Quantos tiros seriam necessários para matar o sonho da revolução alemã? No zoológico de Berlim quem seriam os animais?”.

Mais tarde, sem identificação, dois corpos seriam jogados nas águas frias do canal Landwher. A reação não queria deixar provas do horrendo crime que cometera, mas todos sabiam quem eram os seus autores. Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht estavam mortos, mas a história que construíram se manteria viva na consciência dos comunistas de todo o mundo.

Passados alguns anos, Brecht escreveria o seu epitáfio:

“Aqui jaz 
Rosa de Luxemburgo
Judia da Polônia
Vanguarda dos operários alemães
Morta por ordem
Dos opressores. 
Oprimidos,
Enterrai as vossas desavenças!”

Os primeiros passos

Quem se prendesse apenas à sua origem social decerto não poderia entender como aquela menina, nascida em 5 de março de 1871, filha de uma abastada família de judeus poloneses, havia se transformado na Rosa Vermelha, destacada dirigente do movimento comunista internacional.

Contudo, o ambiente efervescente reinante na Polônia, então dominada pela Rússia czarista, estava levando muitos jovens, como ela, a se engajarem em movimentos contestatórios e mesmo revolucionários. Primeiro, aderindo às lutas estudantis contra as estruturas repressivas mantidas nas escolas polonesas, e depois ingressando nos combates políticos contra a opressão russa e pelo socialista. Este também foi o caminho seguido pela irrequieta Rosa.

Em 1889, com apenas 19 anos, ela se viu obrigada a deixar a sua Polônia e refugiar-se em Zurique, onde concluiu os seus estudos, doutorando-se em Economia. No exílio, em 1894, juntamente com seu companheiro Leo Jogiches, ajudou a fundar o Partido Social-Democrata da Polônia. Pouco a pouco, Zurique se tornava calma e pequena demais para os grandes planos e a personalidade agitada de Rosa. Por isso, em 1898, mudou-se para o centro da luta de classes do momento, o coração da revolução europeia: a Alemanha.

Reforma e revolução

Ao chegar, ingressou imediatamente ao Partido Social-Democrata Alemão (PSDA), o maior partido operário do Ocidente, e logo se viu envolvida na grande polêmica do momento, que podia ser resumida num único e decisivo dilema: reforma ou revolução?

O crescimento relativamente pacífico do capitalismo alemão e a conquista de maiores liberdades democráticas propiciaram avanço eleitoral sem precedente à social-democracia. Isto levou muitos dirigentes partidários a acalentarem esperanças de outra alternativa para a conquista do socialismo que não fosse o caminho revolucionário. O principal teórico dessa via reformista foi Bernstein, dirigente do PSDA e, até então, considerado um dos herdeiros de Engels do qual havia sido amigo.

Ele apregoava que a tendência do capitalismo não era a monopolização crescente da economia, como afirmava Marx, e sim sua democratização através do aumento do número de proprietários, graças à introdução das sociedades por ações. Isso levaria a um fortalecimento das classes médias e não à sua redução. Seriam eliminadas, assim, as previsões “catastróficas” de Marx sobre a polarização crescente da sociedade e o choque inevitável entre burgueses e proletários. O desenvolvimento do capitalismo não levaria necessariamente às crises periódicas, pois ele mesmo estava criando antídotos, através da melhor organização da produção e do planejamento econômico.

Dentro dessa perspectiva, Bernstein elaboraria uma nova tática, que supervalorizava as lutas parlamentar e sindical. Segundo ele, seria através do voto que o trabalhador se elevaria “da condição social de proletário para aquela de cidadão”. A luta sindical por melhores condições de trabalho e salários seria o instrumento privilegiado para conduzir a sociedade capitalista, através das reformas econômicas, para o socialismo democrático. Na verdade, essas reformas já seriam a própria realização molecular da nova sociedade socialista. É dele a famosa frase: “o movimento é tudo e o fim nada significa”.

Rosa foi uma das primeiras a se insurgir contra tais teses, contrária à essência do marxismo revolucionário, escrevendo, em 1899, uma das mais belas obras contra o revisionismo bernsteiniano: Reforma Social ou Revolução?. Neste texto são desmanteladas, com maestria, uma a uma as teses reformistas. Contribuindo, assim, para que elas fossem rejeitadas pela maioria do partido, embora essas ideias continuassem a exercer grande influência sobre vários de seus dirigentes.

O objetivo final do socialismo, afirmava Rosa, “é o único elemento decisivo na distinção entre o socialista e o radical burguês”. A política apregoada por Bernestein “visava a uma única coisa: conduzir-nos ao abandono do objetivo último, a revolução social, e, inversamente, fazer da reforma social, de simples meio de luta de classes, em seu fim”. Rosa, portanto, não negava o papel das reformas, mas acreditava que “entre a reforma e a revolução devia haver um elo indissolúvel” no qual “a luta pela reforma é o meio e a revolução social é o fim”.

As críticas contundentes e mordazes da pequena Rosa mostram muito bem a sua coragem e o seu espírito revolucionário. Poucos no partido, naquele momento, ousariam desafiar a autoridade de Bernstein, muito menos compará-lo a um radical burguês. As teses revisionistas foram criticadas nos congressos da social–democracia alemã de Hannover (1899) e Lubeck (1901). No congresso de Dresden, em 1903, o principal dirigente social-democrata alemão August Bebel apresentaria uma dura moção afirmando: “O Congresso condena de maneira mais decidida o intento revisionista de alterar a nossa tática, posta a prova várias vezes e vitoriosa, baseada na luta de classes (...). Se adotássemos a política revisionista nos constituiríamos em um partido que se conformaria apenas com a reforma da sociedade burguesa”. O Congresso da Segunda Internacional de 1904, em Amsterdã, também foi marcado por este debate e, novamente, as teses revisionistas foram derrotadas. Mas, seus adeptos continuaram no partido e na II Internacional, inclusive na sua direção, e ali esperariam nova oportunidade para retomar a ofensiva contra o marxismo revolucionário.

Em 1904, intervindo numa polêmica da social-democracia russa, Rosa de Luxemburgo fez críticas ao modelo organizativo partidário proposto por Lênin, baseado nos revolucionários profissionais e na necessidade de implantação de uma rígida disciplina, tendo como referência o modelo adotado nas fábricas capitalistas. Contudo, Rosa julgava as propostas do revolucionário russo tendo como ponto de referência a Alemanha e não a Rússia czarista. A fórmula organizativa de Lênin correspondia à situação política vivida no seu país, onde todas as organizações operárias e socialistas eram ilegais e duramente perseguidas. Portanto, a realidade russa impunha uma organização clandestina e rigidamente centralizada. Apesar da crítica feita à política organizativa de Lênin, um ano depois estava ao lado dele na defesa da experiência da revolução russa de 1905 e do instrumento da greve geral. Rosa passava a estruturar a ala esquerda do PSDA.

Contra a burocracia sindical

A social-democracia alemã havia desenvolvido a compreensão de que o partido revolucionário era uma forma superior de organização da classe operária. Era o partido, como vanguarda da classe, que deveria dar direção política às organizações sindicais e populares.

August Bebel havia dito: “Não é da ação sindical que devemos esperar a tomada de possessões dos meios de produção. É preciso, antes de tudo, tomar o governo que monta guarda ao redor da classe capitalista”. Isto só poderia ser conseguido através da luta político-revolucionária, dirigida pelo partido social-democrata. Essa ideia passaria a ser corroída nos anos seguintes, quando ocorreu a burocratização dos sindicatos.

O aumento do número de operários sindicalizados, somado ao crescimento da economia capitalista alemã, possibilitando aos patrões fazerem maiores concessões aos trabalhadores, permitiu a construção de poderosas máquinas sindicais – com sedes, gráficas, editoras, clubes e inúmeros funcionários – e a acumulação de vultosos fundos financeiros. Alguns grandes sindicatos chegaram a criar bancos.

Não sem razão, as direções desses sindicatos foram tomadas de verdadeiro pavor quando a revolução russa de 1905 veio a ameaçar o curso do desenvolvimento “pacífico” do capitalismo alemão. O órgão oficial da central sindical social-democrata logo afirmou: “Não somos de nenhum modo partidário das demonstrações de rua”. O congresso sindical realizado em Colônia chegou mesmo a aprovar uma resolução contrária à utilização da greve geral como instrumento de pressão operária contra o Estado e os patrões. Para os burocratas sindicais, qualquer ação mais ampla e radical das massas operárias levaria, necessariamente, à repressão e a uma desorganização dos sindicatos.

Rosa, então, fez duras críticas aos dirigentes sindicais, apontando as causas do seu reformismo. “Os funcionários sindicais”, afirma ela, “tornaram-se vítimas da burocracia e de certa estreiteza de perspectiva devido à especialização da sua atividade profissional e à mesquinhez dos seus horizontes, resultado de um fracionamento das lutas econômicas em período de calmaria. Esses dois defeitos manifestam-se em diversas tendências que podem ser fatais para o futuro do movimento operário. Uma delas consiste em sobrevalorizar a organização transformando-a, pouco a pouco, num fim em si mesmo e considerando-a um bem supremo a que os interesses da luta devem ser subordinados. Assim se explica (...) essa hesitação ante o fim incerto das realizações de massas e enfim a sobrevalorização da própria luta sindical”.

Quando o Congresso do PSDA realizado em Jena aprovou uma resolução insinuando a possibilidade de utilização da greve geral, de maneira defensiva e em casos excepcionais, os líderes sindicais não perderam tempo em apregoar a necessidade da independência dos sindicatos em relação ao Partido e ratificaram sua posição antigreve. Legien, o principal dirigente sindical da social-democracia alemã, afirmou: “para os sindicatos o que conta não é a resolução tomada no Congresso de Jena, mas a tomada em Colônia”, contrapondo o congresso sindical ao partidário.

A resposta de Rosa colocou as coisas nos seus devidos lugares: “Os sindicatos”, afirmaria ela, “representam o interesse de grupos particulares (...). A social-democracia representa a classe operária e os interesses gerais de sua emancipação (...). As ligações dos sindicatos com o Partido Socialista são as de uma parte com o todo”. A chamada “igualdade de direito” entre sindicatos e o Partido Socialista não seria “um simples mal-entendido, uma simples confusão teórica, mas exprimiria uma tendência bem conhecida da ala oportunista”.

Defendendo o ponto de vista predominante no seio da social-democracia, ela se colocou contra o fato “monstruoso” de que nos congressos do partido e dos sindicatos os militantes socialistas estivessem fazendo aprovar resoluções não apenas diferentes como opostas. Para solucionar o impasse propôs “subordinar de novo os sindicatos ao partido, para o interesse próprio das duas organizações. Não se trata de destruir a estrutura sindical no partido, trata-se de estabelecer entre as direções do partido e os sindicatos (...) uma relação entre o movimento operário em seu conjunto e o fenômeno particular e parcial chamado sindicato”. Alguns anos mais tarde os comunistas mudariam essa formulação que subordinava formalmente os sindicatos ao partido político de vanguarda, mas manteriam a visão de que a luta política revolucionária era superior à luta corporativo-sindical.

A contradição entre as direções dos sindicatos e do partido só existiu enquanto a maioria da direção partidária se manteve à esquerda da direção sindical. Com a vitória das teses revisionistas e reformistas no interior do próprio partido, as relações entre essas duas instâncias tenderam a se harmonizar numa política de caráter antirrevolucionário.

A falência da II Internacional

A história da luta de classe trilha caminhos tortuosos e contraditórios: as vitórias eleitorais e sindicais do PSDA somente reforçaram as posições reformistas no seu interior. Em 1912 o partido obteve mais de 4 milhões de votos, elegendo 110 deputados, tornando-se a maior bancada no parlamento alemão. Dois anos depois, quando do início da Primeira Guerra Mundial, as posições de direita já haviam conquistado a maioria das direções da social-democracia alemã e europeia. Estas acabaram renegando todas as suas resoluções anteriores, colocando uma pedra sobre o seu passado revolucionário, ao votarem favoravelmente aos créditos para a guerra imperialista. “Desde 4 de agosto de 1914”, afirmou Rosa, “a social democracia alemã é um cadáver putrefato.”

Ela acabou sendo presa em 1915 devido ao pronunciamento de um violento discurso contra a guerra e o imperialismo. Na prisão, escreveria o texto A crise da social-democracia, mais conhecido por Folheto Junius, saudado por Lênin como sendo um “esplêndido trabalho marxista”. No mesmo período também escreveria Teses sobre as tarefas da social-democracia internacional, que deveria ser uma contribuição da esquerda social-democrata alemã à Conferência Internacional de Zimmerwald. Ali, a esquerda e o centro social-democrata procuraram se articular contra a sua ala direita e a favor da paz mundial.

Nas suas teses, Rosa afirmaria: “A guerra esmagou a Segunda Internacional (...). Os representantes oficiais dos partidos socialistas dos principais países traíram os objetivos e interesses da classe operária (...) e passaram para o campo do imperialismo. Assim, constitui uma necessidade vital para o socialismo criar uma nova internacional operária, que tome em suas mãos a direção e coordenação das lutas revolucionárias de classe contra o imperialismo internacional”. Solta no início de 1916, ela continuaria seu trabalho revolucionário – o que lhe custaria nova prisão menos de seis meses depois de sua libertação.

Em 1916 realizou-se uma conferência da esquerda social-democrata alemã que se decidiu pela publicação de um periódico chamado Spartacus, nome pelo qual ficaria conhecido o grupo liderado por Rosa e Karl Liebknecht. Em 1º de maio o grupo Spartacus procurou organizar uma manifestação contra a guerra imperialista. O resultado foi a prisão de Karl, acusado de traição à pátria. Os dois revolucionários alemães ficariam presos até 1918 quando uma revolução veio libertá-los.

Em 1917, rompidos com o PSDA, os centristas, liderados por Kautsky, e a esquerda formavam outra organização política: o Partido Social-Democrata Independente (PSDI). Apesar de possuir um programa internacionalista e antibelicista, graças à atuação dos centristas, o novo partido atuava de forma vacilante e defensiva diante da direção revisionista do PSDA.

Rosa e a Revolução Russa

Em 1918, Rosa escreveria uma série de artigos nos quais defendia a revolução socialista na Rússia, naquele momento sob ataque cerrado da direita e do centro social-democrata encabeçado por Kautsky. A capacidade bolchevique de vencer todas as dificuldades impostas pela contrarrevolução a empolgava: “Os bolcheviques têm demonstrado que podem fazer tudo o que um partido verdadeiramente revolucionário pode fazer nos limites de suas possibilidades históricas. Não procuram fazer milagres. E seria um milagre uma revolução proletária modelar impecável num país isolado, esgotado pela guerra, premido pelo imperialismo, traído pelo proletariado internacional (...). E é nesse sentido que o futuro pertence em toda parte ao ‘bolchevismo’”.

O apoio irrestrito à revolução não a impediu de fazer várias críticas às medidas revolucionárias adotadas pelos bolcheviques. Uma parte delas estava impregnada por certo idealismo e esquerdismo teórico. Rosa, por exemplo, menosprezava a necessidade da aliança com os camponeses pobres e não compreendia a proposta de Lênin em relação às nacionalidades oprimidas. Negava a necessidade de incluir no programa dos revolucionários russos o direito à “autodeterminação dos povos” sob o domínio do antigo império czarista. Considerava estas propostas como concessões perigosas aos nacionalismos das burguesias locais. A maior parte das objeções seria revista no ano seguinte, quando saiu da prisão e pôde ter maior contato com a experiência soviética.

A crítica merecedora de maior atenção é aquela que tratava do processo de construção da ditadura do proletariado, que acreditava ser simples sinônimo de democracia socialista. Ela se preocupava com algumas medidas repressivas tomadas pelo governo soviético contra membros de organizações consideradas socialistas, ainda que equivocadas. Afirmou Rosa: “abafando a vida política em todo o país, é fatal que a vida no próprio soviete seja cada vez mais paralisada. Sem eleições gerais, sem liberdade ilimitada de imprensa e de reunião, sem luta livre de opiniões, a vida morre em todas as instituições públicas, torna-se uma vida aparente, onde a burocracia resta como único elemento ativo (...). Algumas dezenas de chefe de uma energia infatigável e de um idealismo sem limites dirigem o governo e, entre eles, o que governam de fato são uma dezena de cabeças eminentes, enquanto uma elite da classe operária é convocada de tempos em tempos para reuniões com o fim de aplaudir os discursos dos chefes e de votar unanimemente as resoluções que lhes são apresentadas (...). Ainda mais: tal estado de coisas deve provocar necessariamente uma ‘barbarização’ da vida pública, atentados, fuzilamentos de presos etc. ”

Rosa não conhecia as particularidades do desenvolvimento da luta de classes na Rússia pós-revolução, por isso tendia a subestimar o papel desempenhado pelas forças contrarrevolucionárias internas, em muitos casos apoiadas por partidos ligados à II Internacional, ainda tidos como socialistas e marxistas. As medidas restritivas à democracia operária, tomadas pelos bolcheviques, também poderiam ser debitadas às difíceis condições em que vivia a jovem Rússia soviética entre 1918 e 1921, cercada e ocupada por diversas potências imperialistas.

A verdadeira tragédia está no fato de que as medidas discricionárias que deveriam ser provisórias, necessárias numa fase de consolidação do socialismo contra a reação armada interna e externa, se transformaram em políticas de Estado, realizando assim algumas das previsões de Rosa sobre o futuro da democracia socialista na Rússia. Se a crítica de Rosa se encontrava desfocada naqueles primeiros anos da revolução, cairia como luvas para as novas condições formadas na segunda metade da década de 1930.

A Revolução Alemã 1918

Na Alemanha, pouco a pouco o sentimento nacionalista dos primeiros dias do conflito mundial foi substituído pela revolta. Os operários começavam a se agitar diante do alistamento militar forçado, os constantes cortes nos salários e os racionamentos de alimento. Não tardou e o descontentamento chegou às tropas, principais vítimas da guerra. Em junho de 1917, os marinheiros se rebelaram e foram violentamente reprimidos, com aval do PSDA.

Ainda nas prisões os espartaquistas conclamaram: “não há senão um meio de deter a carnificina dos povos e alcançar a paz: é desencadear uma luta de massas que paralise toda a economia e a indústria bélica, é instaurar através da revolução, liderada pela classe operária, uma República popular na Alemanha”.

A vitoriosa Revolução de Outubro na Rússia apenas serviria para acirrar os ânimos. Nas frentes de batalha os soldados se confraternizavam; nas cidades as greves multiplicavam-se e formavam-se conselhos de operários e soldados, seguindo o modelo soviético. O governo e a monarquia foram colocados em xeque pelas massas insurgentes. Em 9 de novembro de 1918, irrompeu uma rebelião em Berlim e o próprio PSDA foi obrigado, pela pressão dos operários, a aderir ao movimento. Os soldados recusaram-se a cumprir ordens dos oficiais e uniram-se ao povo. A revolução operária e popular vencia o primeiro round. E agora?

O governo oligárquico desabou feito um castelo de cartas. O imperador Guilherme III abdicou e entregou o poder ao chanceler Max Baden. Este, por sua vez, passou o bastão para as mãos do social-democrata Friedrich Ebert. Muitos achavam que a revolução havia chegado ao fim. Foi dentro desse espírito que Ebert lançou sua conclamação: “Cidadãos, peço-lhes que abandonem as ruas, cuidem da tranquilidade e da ordem”. Enquanto isso, outro membro de seu partido, Scheidemann, proclamava a República. A poucos metros dali uma multidão de operários se concentrava para ouvir Karl Liebknecht, recém-libertado da prisão, que afirmava a necessidade do estabelecimento da República alemã. Não uma República burguesa, disfarçada de República social, mas uma República socialista.

Ebert então se apressou a formar o novo governo do qual participariam o PSDA e a ala direita do Partido Social-Democrata Independente. A pressão popular impediu a entrada de membros dos partidos burgueses responsáveis pela guerra. Liebknecht foi convidado a ingressar no governo, mas impôs uma condição: que todo poder fosse entregue aos conselhos operários – o que evidentemente não foi aceito. Então os espartaquistas, fora do governo, resolveram continuar com os seus preparativos de insurreição.

“Nós pedimos, pelo contrário, que ninguém abandone as ruas e que todos permaneçam armados. A conclamação do novo chanceler, que substituiu o derrotado imperador, procura enviar as massas para os seus lares para melhor poder estabelecer a velha ordem das coisas. Operários, soldados: permanecei alerta!”, conclamavam os spartaquistas. A luta atingiu outro patamar, a burguesia se escondia por detrás de um “partido operário”, justamente o partido que havia pertencido Marx e Engels.

No dia 16 de dezembro, o Conselho Nacional, que congregava todos os conselhos operários, dominados pelo PSDA, decidiu entregar o poder à Assembleia Nacional Constituinte que seria eleita em janeiro. A mesma coisa que haviam feito os mencheviques na Rússia. Diante da capitulação do Partido Social-Democrata Independente, que aceitara participar do governo e a submissão à futura Constituinte, os espartaquistas romperam a unidade e fundaram o Partido Comunista da Alemanha (PCA). Outras decisões tomadas pelos comunistas foram: não participar da eleição para a Assembleia Nacional Constituinte e continuar os preparativos para a insurreição armada. Especialmente essas duas últimas posições não correspondiam a real correlação de forças existente na Alemanha, por isso tanto Rosa como Karl mostraram-se reticentes em relação a elas.

No início de 1919 um ato de provocação do governo precipitou os acontecimentos. Marinheiros amotinados foram brutalmente reprimidos pelo exército. Em resposta, os operários tomaram as ruas. O chefe da polícia, ligado à esquerda do PSI, recusou-se a reprimir as manifestações e foi demitido do cargo. O PCA e a esquerda do PSI se uniram e convocaram manifestações de protestos contra Ebert-Scheidemann. Uma multidão invadiu o distrito da imprensa, onde se encontravam os jornais reacionários. Naquela mesma noite, o PCA decidiu-se pela insurreição geral. Em 9 de janeiro, num ato inesperado, os operários espartaquistas tomaram o Reichstag (parlamento alemã) sendo rapidamente desalojados pelo exército. Depois de cinco dias de violentos combates de rua, a insurreição foi derrotada. No dia 15, em meio à avaliação do movimento, Rosa e Liebknecht foram sequestrados e assassinados pelos militares. Ao final do seu último artigo Rosa escreveu: “‘A ordem reina em Berlim’, Esbirros estúpidos! Vossa ‘ordem’ é um castelo de areia. Amanhã a revolução se levantará de novo clamorosamente, e para espanto vosso proclamará: Era, sou e serei”.

Epílogo

Após a sua morte, Rosa passou a ser o alvo de violentas críticas, em especial dos dirigentes da social-democracia. Em sua defesa vieram as palavras firmes de Lênin:

“A esses (críticos) responderemos com um velho ditado russo:
‘Às vezes as águias descem 
e voam entre as aves do quintal, 
mas as aves do quintal jamais
se elevarão até as nuvens’
Rosa equivocou-se em muitas coisas, a respeito da independência da Polônia, na análise dos mencheviques em 1903, na sua teoria da acumulação de capital (...), equivocou-se no que escreveu na prisão de 1918 (corrigiu a maioria desses erros no final de 1918 e início de 1919, quando voltou à liberdade). Mas, apesar de seus erros, foi e continua sendo uma águia”.


*Augusto C. Buonicore é historiador, diretor de publicações da Fundação Maurício Grabois. E autor dos livros Marxismo, história e revolução brasileira: encontros e desencontros; Meu verbo é lutar: a vida e o pensamento de João Amazonas; e Linhas Vermelhas: marxismo e dilemas da revolução. Todos publicados pela Fundação Maurício Grabois e Editora Anita Garibaldi. 

Nota:

Este texto é uma adaptação do artigo publicado na revista Debate Sindical nº 30, junho-agosto/1999. Republicado como apresentação do livro “Rosa de Luxemburgo: vida de obra”, organizado por Isabel Loureiro e editado pela Expressão Popular. 

Bibliografia 

ETTINGER, Elzbieta. Rosa Luxemburgo: uma vida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1989.
GUIMARÃES, Juarez R. (org.). Rosa Vermelha. São Paulo: Busca Vida, 1987.
LOUREIRO, Isabel (org.). Rosa de Luxemburgo: vida e obra. São Paulo: Expressão Popular, 1999.
________. Rosa de Luxemburg: os dilemas da ação revolucionária. São Paulo: Unesp, 1995.
LUXEMBURGO, Rosa. Greve de Massas, Partido e Sindicatos. Coimbra, Portugal: Centelha, 1974.
________. Reforma Social ou Revolução?. São Paulo: Global, 1986.

domingo, 13 de janeiro de 2019

O PODER MANDA, O GOVERNO EXECUTA, A INFORMAÇÃO ILUDE

Pedro Augusto Pinho*
Pimeira Parte: O Poder
O Poder não é um princípio imaterial. Quando alguém se refere ao poder do comunismo, deverá estar se referindo a um Estado, a um partido ou a uma liderança que seja capaz de conduzir alguém para o sistema comunista.
Mas também não pode ser tão vago que deixe dúvida. Que comunismo? O das populações primitivas? O de missões de jesuítas na América do Sul? O materialismo dialético de Marx-Engels?
Ao afirmar que o poder que nos pressiona e conduz, atualmente, é o poder do sistema financeiro internacional (banca), devo definir os objetivos e os agentes deste poder. Se não o conseguir, terá sido uma afirmação vã, como o comunismo que ameaça o Brasil.
Comecemos por definir os objetivos da banca.
Como sabem meus esclarecidos leitores, as fontes de rendas são diversas. Há aquelas decorrentes do trabalho, que denominamos salários e direitos autorais; as obtidas de propriedades imobiliárias, os alugueis; as cobradas pelos Estados, os tributos; as resultantes das atividades industriais, comerciais, de serviços, os lucros, e outras.
A banca pretende e age para que todas estas rendas sejam canalizadas para o sistema financeiro.
Como faz isso?
Pela dívida. A dívida, como já pude detalhar em artigos anteriores, é a principal arma para conquista do poder pela banca. E ela consegue inúmeros adeptos, na grande maioria absolutamente ingênuos, sem saber o quanto estão perdendo de usufruir vida melhor pelas ações da banca. Exemplo: o vendedor que lhe procura convencer a pagar a prazo, o que você pode pagar a vista, pois você ficará com mais dinheiro para outras despesas.
E para construir a dívida, inclusive dos Estados, a banca usa e abusa da corrupção. Pode-se afirmar, sem receio ou erro, que a grande corrupção, a propagação dos ilícitos, nessa nossa existência, deve-se primordialmente à banca.
Outro objetivo da banca é promover a permanente concentração de renda. É objetivo autofágico.
Agora sabemos o nome do poder, como age e quais seus objetivos.
Há outro dado importante: a vinculação da banca com atos ilícitos.
Quando Margaret Thatcher e Ronald Reagan (governos), agindo por instruções da banca, promoveram as desregulações no sistema financeiro, colocaram os ganhos ilícitos – tráfico de drogas, de órgãos humanos e de pessoas, contrabando de armas, caixas 2 e outras ações políticas e corruptas – em instituições da banca. Uma pesquisa sobre movimentações financeiras de fonte não identificada, na década 1990/99, leva-nos a concluir que o aporte dos ilícitos à banca foi da ordem de US$ 4 trilhões. Podemos acrescentar que as atividades ilícitas e a banca atuam em comunhão de interesses.
Vejamos, agora, quem é a banca.
A concentração de renda e a contínua especulação com os valores financeiros  dificultam a hierarquização da banca por seus patrimônios.
Há vinte e cinco/trinta anos seria um pouco mais fácil, pois a banca era composta pelas trilionárias famílias, como os Windsor britânicos, os Orange holandeses, os Rothschild judaicos etc. Hoje, ou melhor, a partir deste século XXI, são empresas que administram os fundos, formados não só por estas famílias como por trabalhadores e todos que imaginam ser possível, no modelo da banca, melhorar suas condições de vida.
O chamado mercado nada mais é do que o enorme cassino onde a banca faz suas apostas. Quanto mais apostadores, maior a probabilidade da banca se apoderar das poupanças alheias. É por esta razão que a banca promove campanhas de privatizações, a extinção de previdências públicas, para só as ter privadas, colocar nas pessoas medo de um futuro fora do “mercado”, restringir orçamentos públicos com “tetos”, “austeridades”, “limites de gastos”, exceto para os gastos com juros e encargos financeiros.
Não há, fora da teoria, qualquer competitividade. Pois a banca está em todos os conselhos de todas as empresas. E as pessoas que pertencem a famílias ricas ou de classe média confortável podem ter professores, tempo para frequentar ambientes culturais, dinheiro para viajar e levam enorme vantagem sobre os que precisam trabalhar e estudar simultaneamente. Os pobres aprovados em concursos de avaliação cognitiva são minorias ínfimas, quando acontece haver algum.
Em relação a competição entre empresas, a Presidente Dilma ofereceu um caso notável, reportado pelo jornalista Luis Nassif, em artigo de setembro de 2014, “Como Dilma conseguiu perder o apoio da indústria”. Ao qual respondi, no mesmo GGN, de Nassif, em 03/08/2018, com “Assim é (se lhe parece)”, de onde transcrevo:
“A FIAT tem como seus cinco maiores acionistas:
1 – Exor NV (empresa italiana de investimentos);
2 – Baillie Gifford & Co.;
3 – Harris Associates LP;
4 – Blackrock; e
5 – The Vanguard Group.
A VOLKSWAGEN tem como cinco maiores acionistas:
1 – Qatar Investment Authority;
2 – The Vanguard Group;
3 – Causeway Capital Management;
4 – Amundi Asset Management; e
5 – Blackrock.
A GENERAL MOTORS tem como cinco maiores acionistas:
1 – The Vanguard Group;
2 – Blackrock;
3 – Harris Associates;
4 – State Street Corporation; e
5 – Berkshire Hathaway.
A FORD tem como cinco maiores acionistas:
1 – The Vanguard Group;
2 – Blackrock;
3 – Newport Trust;
4 – Street State Global Advisors Funds Management; e
5 – Wellington Management.
A RENAULT é empresa de economia mista. Aqui diríamos que é uma estatal.  Dois acionistas, o Governo da França e a Nissan Motor, tem, cada um, 15% das ações. O terceiro maior acionista é a própria Renault que com o fundo de seus empregados possuem 4,20% do capital da companhia. Mas é curioso saber que The Vanguard Group e Blackrock também compartilham ações da Renault”.
Inúmeros outros exemplos poderia oferecer a meus caros leitores. Mas prefiro apresentar os principais membros da banca, conforme pesquisa por mim realizada, neste mundo maravilhoso das comunicações virtuais.
Há diversos sites que, como apontaria Chacrinha, “vieram para confundir e não para explicar”. Havendo interesse, recomendo que busquem as composições acionárias das empresas negociadas em bolsa, destacando seus proprietários institucionais.
Meus dados são do início de dezembro de 2018. Diferentes dos que coletei em agosto do mesmo ano. Este fato comprova minhas afirmativas sobre a autofagia da banca e sobre o cassino que é o “mercado”.
Empresas, com mais de um trilhão de dólares em aplicações, que controlam não só as economias internacionais e nacionais, mas as empresas de comunicação de massa, da indústria cultural e muitos governos sejam de países desenvolvidos ou colonizados:
BlackRock, a maior, com cerca de US$ 8 trilhões (apenas para ter o significado  deste valor, o Produto Interno Bruto do Brasil, para o ano findo, está avaliado em US$ 2,2 trilhões, o dos Estados Unidos da América (EUA) possivelmente superior a US$ 20 trilhões). Seguem o Vanguard Group com mais de US$ 6 trilhões, a Charles Schwab com US$ 4 trilhões, o JP Morgan com mais de US$ 3 trilhões, o State Street Global Advisors, que teve um ano ruim, com US$ 3 trilhões, o Fidelity, também com perdas, mas se mantém próximo aos US$ 3 trilhões. A estes seis grandes, elencamos, com mais do que US$ 1 trilhão: Allianz, BNY Mellon, Wellington eAmundi. Também podemos considerar membros de destaque da banca: o BNP Paribas, o Santander, o Bank of America e o Goldman Sachs.
Certamente meu arguto leitor está sentindo a ausência de empresas/investidores asiáticos. Há, obviamente, explicações.
A Ásia adotou modelos diferentes de economia. No Japão é o Estado que orienta os megaconglomerados, cujos bancos agem como verdadeiras tesourarias e arrecadadores e investidores. Há 50 anos, aproximadamente, não era assim. Mas os Governos japoneses tiveram a sabedoria de não entrar no cassino (“mercado”). Isto mantém uma economia equilibrada que atende, com sua escassez de recursos naturais, o País e sua população.
A China está voltada para seu desenvolvimento. Seus bancos financiam suas empresas que procuram, como qualquer país colonizador, comprar e vender, tendo nesse colonialismo mercantilista seus recursos em divisas. Nunca esquecer que a China precisa alimentar 20% da população da Terra.
O sudeste asiático vem sendo castigado pelas políticas da banca e dos interesses geoestratégicos estadunidenses. O mesmo acontece com a Índia, que não pode promover um processo de capitalização nacional capaz de a impulsionar seu desenvolvimento para novo patamar.
Ficamos assim, Atlântico Norte e Atlântico Sul sujeitos ao jogo e à corrupção da banca.
Nos próximos artigos trataremos do Governo e da Informação.
Informação II
O fato histórico, oculto pelas pedagogias colonizadoras, é a construção das estruturas de governo pelo poder. Não irei reproduzir a formação dos Estados, a partir da Idade Média. Basta verificarmos o que ocorreu no Brasil, a partir dos Governos Militares.
O golpe desfechado em 1964 foi, ainda, realizado pelo poder do capitalismo industrial estadunidense, o que comprovam a intromissão da CIA (Central Intelligence Agency), as ações do Embaixador Lincoln Gordon, as referências nas memórias do Coronel Vernon Walters e toda a documentação dos arquivos do governo dos Estados Unidos da América (EUA) já divulgada. O golpe seguinte ocorreu em 1967 e recuperou boa parte do controle do Governo Brasileiro para as Forças Armadas nacionais e para indústria, especialmente a do Estado de São Paulo. O terceiro golpe foi aplicado no Presidente Geisel e no Comando Militar para escolher o General Figueiredo para a presidência. O poder, então, já não era do Estado representante do capitalismo industrial mas do sistema financeiro internacional, que denomino banca.
A banca orientou a Constituição de 1988 para que o governo brasileiro ficasse nas mãos do poder sem voto: o judiciário. Lembremos que o poder militar fora alvo de golpe pela banca.
Apenas o Poder Militar, nos dias de hoje, 2019, ameaça o governo do judiciário que atende prioritariamente à banca.
Vejamos exemplos da ação dos Governos, após o Presidente Geisel, que comprovam o poder que tomou conta do Brasil.
Os Estados nacionais são os maiores, se não o maior inimigo da banca, ou, como alguns preferem designar, da Nova Ordem Mundial (NOM).
Daí a estupidez dos Estados Mínimos.
O que significa Estado Mínimo, desburocratização do Estado Nacional, simplificação tributária e outras expressões do vocabulário da banca? Que o Brasil, ou qualquer outro Estado, abrirá mão de seu poder de governar para reproduzir, no País, a uniformidade administrativa que facilita a gestão e aumenta os lucros da banca.
Se cada país, mesmo acolhendo os capitais especulativos, fixar taxas diferentes, com requisitos distintos, multas diferenciadas, formulários com dados diversos, a banca terá enorme ônus para se adaptar às formalidades destes países. Mas se tiver um Estado Mínimo, com legislações e administrações padronizadas, o que fizer para Bélgica, Ruanda, Samoa, Costa Rica, servirá também para o Brasil. Enorme economia e simplificação administrativa, maiores lucros. E a soberania nacional? Ora, a soberania ……
Portanto são estes engodos que levam muitas pessoas a considerar avanço civilizatório a submissão aos interesses da banca.
Em outras palavras, colocar nos governos “técnicos” que prometem simplificar “a vida” (sic) de cada um. E o coitado, que nem sabe o que é o “swap cambial”, pensa que está votando numa solução técnica quando está apoiando o interesse político estrangeiro, para a mais eficiente apropriação dos nossos recursos. Paulo Guedes, por exemplo, ou Henrique Meirelles, ou Pedro Malan, ou Joaquim Levy, ou Ivan Monteiro, ou Marcos Lisboa, ou Armínio Fraga, ou, ou, ou todas estas gerações formadas pela banca, eles a representam e não o Brasil.
A classe média sempre reclama da (falta de) educação, imagina que exista competitividade, no mundo de monopólios e acordos de acionistas, que o saber diferenciado fará diferença na vida. Mas não se pergunta: que saber é esse? Que diferença – ou usando a palavra de Pierre Bourdieu – de que distinção se trata?
Podemos identificar os anos 1960 como da arrancada da banca para o domínio mundial, conseguido em 1990. Foi naquela década que houve a grande crítica e a crise do ensino, da cultura, do saber.
Na França, nos EUA, na Inglaterra, mesmo no fechado mundo soviético, surgiram reflexões sobre o conhecimento e os usos do conhecimento.
A banca teve a inteligência de perceber a possibilidade de transformar o saber em outro instrumento de dominação (nunca esquecer que a dívida é a arma principal da banca). E foram os governos destes mesmos países, da academia e da juventude críticas, que acabaram por promover a nova pedagogia colonial.
A sempre competente Vila Mandinga, em Nota do Tradutor, ao primoroso trabalho da entrevista de Henry Giroux, feita pelo professor Mitja Sardoč (“A linguagem da educação neoliberal”, Counterpunch, 25/12/2018), escreve:
“Os imperativos econômicos do neoliberalismo, combinados com as tecnologias da Nova Administração Pública provocaram mudanças profundas na organização dos locais de trabalho em muitas sociedades capitalistas contemporâneas. Práticas de mensuração, incluindo ‘indicadores de desempenho’ e ‘benchmarking’ [tabelas de desempenho comparativo] são cada vez mais usadas para medir e reformar organizações do setor público, e melhorar a produtividade e as condutas de indivíduos em inúmeras profissões. Esses processos resultaram no desenvolvimento de uma cada vez mais penetrante invasiva ‘cultura de auditagem’, que extrai sua legitimidade da ideia de que estaria promovendo a ‘transparência’ e os mecanismos e processos para cobrar e prestar contas [ing. transparency and accountability]. A partir de exemplos do Reino Unido, particularmente da reforma das universidade pós-1990s, esse artigo (“Audit culture and Illiberal governance: Universities and the politics of accountability” [Cultura da auditagem e governança não liberal], Cris Shore, 2008) propõe-se a analisar as origens e a disseminação dessa ‘cultura da auditagem’, e teoriza algumas implicações dela para a construção de subjetividades acadêmicas. As perguntas que faço são: Como essas tecnologias da auditagem estão remodelando o ambiente de trabalho e que efeitos têm elas sobre o comportamento (e a subjetividade) dos acadêmicos? O que a análise da ascensão do gerencialismo [ing. managerialism] nos diz sobre processos históricos mais amplos de poder e mudança em nossa sociedade? E por que os acadêmicos são aparentemente tão cúmplices e tão incapazes de resistir contra esses processos?”
Neste século XXI, alunos e professores de economia, de renomadas universidades inglesas, portuguesas e estadunidenses, como Harvard, foram à rua e à imprensa denunciar o ensino do que seria a ciência econômica, transformada em marketing financeiro.
A universidade é o local privilegiado do pensamento, onde surgem as ideias e as críticas que serão um dia a comunicação, o transporte, a produção sem riscos e acessíveis a todos os seres humanos. Transformar este local simplesmente em formadores de agentes de venda é verdadeiro crime contra a humanidade.
O administrador é antes de tudo um incentivador e orientador de trabalho; criativo, inovador, transformador para o próprio executante. Como sobreviver à régua equalizadora das auditagens e “accountabilities”?
E observe o atilado leitor que nem trato do simplismo de um Fernando Collor, de um Fernando Henrique Cardoso, de um Michel Temer, meros encaminhadores das ordens do poder – a banca – repetindo, como papagaios, sem qualquer contribuição pessoal, as ignomínias do tripé macroeconômico, dos superavits fiscais, do câmbio flutuante, do mercado contra o Estado Nacional. Embora não tenha incluído Lula neste rol, apenas por não ter feito a defesa da banca, sua ação em momento algum impediu a atuação perniciosa do sistema financeiro internacional no Brasil.
A estrutura de governo brasileiro continua, mais de cinco séculos de domínio colonial, assentada nos pilares trazidos em 1549 pelo Governador Geral Tomé de Souza: finança,  justiça e defesa,  esta última sistematicamente empobrecida pela defasagem científica e tecnológica.
No Brasil, as castas exportadoras de produtos primários, aliadas dos colonizadores, sejam portugueses, ingleses, estadunidenses, agora a banca, sempre combateram a industrialização. E por que? Pela transformação social que a produção e o consumo trazem necessariamente. A industrialização exige o consumo de massa. Atribuo boa parte da derrocada soviética à ausência da perna do consumo, desequilibrando o corpo estrutural do governo industrial.
Vejo também na estrutura de organização de governo, sem a vinculação das partes ao todo, de ações importantes – a bolsa família, a ação integral do SUS, a construção de habitações populares – desvinculadas do projeto maior de construção da cidadania, uma de suas fragilidades e a facilidade com que são eliminadas e corrompidas. O mesmo ocorre com os períodos de industrialização e de desenvolvimento científico e tecnológico, desvinculados da construção do Estado Nacional Soberano.
Não se justifica, desde o trabalho de Ludwig von Bertalanffy (1901-1972) sobre a Teoria de Sistemas (“General System Theory”, George Braziller, New York, 1968), que se construa uma organização do Estado desvinculada de seu propósito maior. A meu ver, as estruturas organizacionais do Estado Nacional Brasileiro deveriam estar reunidas nos três principais objetivos do governo nacionalista: a construção da soberania nacional, a construção da cidadania e as seguranças (da pessoa, do patrimônio e dos direitos). Para estes três grandes grupos haveria a manifestação da população, sob a forma de legislativos ou conselhos, e a estrutura executiva seria o detalhamento para as ações.
Penso que o País, assim estruturado, teria maior facilidade no enfrentamento de colonizadores. O Governo passaria a ser executor do interesse nacional, definido pelo voto, sem a nefasta influência da informação subordinada aos desejos destes colonizadores, como veremos no último artigo desta série.
Informação III
Os vinte anos que medeiam a descoberta da fissão nuclear e o lançamento do Sputnik I (1938-1957) foram de extraordinária importância para a vida humana. Foram os anos da energia nuclear, do conhecimento aeroespacial e da mudança no conceito e usos de informação. Neste artigo vou me limitar à informação, como passou a ser tratada após os trabalhos inaugurais dos matemáticos Norbert Wiener (“Cybernetics or Control and Communication in the Animal and the Machine”, The M.I.T. Press, 1948, Cambridge) e Claude Shannon e Warren Weaver (“The Mathematical Theory of Communication”, University of Illinois Press, 1949, Urbana).
Ao prefaciar a 2ª edição de “Cybernetics”, em 1961, Wiener escreveu “as noções da informação estatística e da teoria do controle eram novidade e, talvez, até tivessem chocado as noções à época (1948) estabelecidas” (“The notions of statistical information and control theory were novel and perhaps even shocking to the established attitudes of the time”).
Por que o capitalismo industrial, o poder naquela época, não soube se apropriar da riqueza de aplicações, que a teoria da informação descortinava, como seu opositor, o capitalismo financeiro, o fez?
Só posso constatar que o industrialismo – capitalista e socialista – restringiu ao trabalho, à robotização, sua compreensão da informação (comunicação e controle). O que chamo banca, o sistema financeiro, viu muito mais aplicações e recursos na separação suporte/semântica na informação, como denominaria o matemático francês Louis Couffignal (“Les Notions de Base”, Gauthier-Villars, 1958, Paris).
O modelo apresentado por Shannon tratava da difusão de mensagens quanto ao suporte. Suas preocupações eram as codificações/decodificações e o meio físico, com os ruídos inevitáveis e as redundâncias necessárias. A influência destas mensagens nos receptores estaria no âmbito de outras disciplinas, como ficou evidenciado no importantíssimo encontro de 1962, em Royaumont, perto de Paris, sobre o “Conceito de Informação na Ciência Contemporânea”.
Além de Norbert Wiener, este encontro acolheu o historiador Giorgio de Santillana, o sociólogo Lucien Goldmann, o pedagogo Helmar Frank, o microbiologista e Prêmio Nobel André Michel Lwoff, o engenheiro e físico Abraham Moles, os filósofos François Bonsack e Gilles-Gaston Granger, os matemáticos Henryk Greniewski e Louis Couffignal entre outros.
John R. Pierce (“Symbols, Signals, and Noise: The Nature and Process of Communication”, Harper and Brothers, 1961, NY), no ultimo capítulo deste seu livro, face à riqueza de soluções abertas pela teoria da informação, escreve que “é certamente maravilhoso que uma nova noção possa contribuir para a solução de tão larga gama de problemas”, como da linguagem, da psicologia e das artes.
Vejamos um caso prático, absolutamente possível da aplicação, desta separação da mensagem na votação, sem comprovação, em “urna eletrônica”, como feito no Brasil. O tratamento da mensagem é estatístico, o que permite, por exemplo, a cada três grupos semântica/suporte idênticos, introduzir uma variação na semântica, ou seja, para o mesmo suporte computar outra semântica (nome de outro candidato). Os exemplos seriam numerosos e fraudariam a vontade popular de modo técnico, com a aplicação dos recursos da teoria da informação. Talvez seja a razão do poder judiciário, que melhor do que qualquer outro advoga os interesses da banca no Brasil, seja o que mais se opõe ao voto impresso.
Também a banca percebeu a contribuição destas descobertas para a pedagogia colonial, forma de dominação tradicional, utilizada pelos poderes para manter os colonizados ou dominados sem capacidade de refletir sobre suas situações ou alterá-las.
A banca passou a ser dona de grande número de empresas de comunicação de massa e a influenciar também a indústria cultural, que estava em crescimento extraordinário com o filme colorido para o cinema (1935) e a televisão (1939). Foi, por conseguinte, com as armas fornecidas pelas teorias apresentadas nos anos 1940 que a banca passou a conquistar cada vez maior poder até dominar, não só a economia, mas a política, o psicossocial dos povos, e os próprios governos a partir de 1990.
Foram também as possibilidades abertas pela teoria da informação que possibilitaram a ciência da computação, os estudos sobre fractais e tantas outras  tecnologias e ferramentas, colocadas neste século XXI à disposição dos que tenham recursos para utilizá-las. Podemos afirmar que este conhecimento, apropriado pelo capitalismo financeiro, tornou-se mais um elemento de concentração de poder.
Nas últimas eleições nos Estados Unidos da América (EUA) e no Brasil, foram inúmeras as acusações de interferências, nem sempre lícitas ou controláveis, no processo de convencimento dos eleitores. Surgiram “demonstrações” da ação de empresas, como a Cambridge Analytica, de personalidades como seu fundador Steve Bannon, dos usos dos whatsApp, das fake news pelas redes virtuais e outras aplicações da teoria da informação.
Tudo, no entanto, pode ser resumido no controle que o poder da banca exerce sobre os sistemas de informação e das comunicações. Há a ausência indesculpável dos Estados Nacionais sobre esta sua responsabilidade frente aos cidadãos e, ouso afirmar, sobre a própria humanidade.
No Brasil, o estadista Presidente Ernesto Geisel bem tentou, pelo Estado com a Cobra, e pela empresa privada com a Itautec, promover a capacitação brasileira. Teve êxito, pois o Brasil chegou a construir, com tecnologia e materiais nacionais, os minicomputadores. Se não tivesse ocorrido o golpe de 1979 e a destruição do sistema de informática nacional, talvez meu caro leitor não estivesse escravo da Apple, da Microsoft, da Samsung, do Windows e de toda esta invasão estrangeira na informação brasileira. Ainda nos anos 1990, a Marinha de Guerra desenvolvia linguagem com base no Linux. Não sei como estará agora, com tantos governos da banca desde então.
Vejamos outro aspecto da comunicação, o psicossocial, que acontece agora, no momento que escrevo este artigo. “Acusam” um filho do General Hamilton Mourão, funcionário concursado, há 18 anos no Banco do Brasil, por ter sido escolhido para cargo comissionado, para o qual preenche os requisitos.
Um ingênuo leitor apontaria o PT ou “as esquerdas” pela divulgação e pelos ataques. Claro que há bobos e maus-carateres para isso. Mas a quem interessaria, mais do que a qualquer outro poder, esta farsa?
O Vice-Presidente representa, na heterogênea composição do Governo Bolsonaro, a única força que pode se opor à banca: os militares.
Entre os principais representantes do capital financeiro, está o Ministro da Economia, que responde a processos pelos eventuais atos ilícitos que teria praticado no cassino ou no “mercado”. Parece-me evidente que, tendo a banca o controle dos meios de comunicação, um ataque ao General Mourão, como para outros militares no Governo (não no Poder, como já espero ter deixado claro nos artigos anteriores) surjam a conta gotas.
Não seria o caso do General Augusto Heleno, no uso das atribuições de seu Ministério, investigar as informações produzidas pela banca? Ou apenas se considera oposição as estilhaçadas esquerdas, se estas já não se acumpliciaram com a própria banca, como pensam alguns bem informados e bons analistas da imprensa virtual?
CONCLUSÃO
Não tenho a paranoia de ser dono da verdade. Muito ao contrário. Permanentemente me interrogo sobre as conclusões a que chego, confiro-as com outras, principalmente opostas. Porém o mais de meio século de diferentes experiências profissionais, a formação acadêmica também diversificada, permitem-me colocar, mais do que respostas, as perguntas que suponho adequadas ao Brasil deste século.
São, entre várias, as que apresento no título destes artigos: quem é o poder? quem executa suas ordens? como sabemos o que ocorre?
Devemos deixar de perseguir fantasmas. Espero ter aberto, a outros mais capazes e igualmente interessados no Brasil, esta mesma curiosidade.
Seria muito gratificante começar a ler outras perspectivas, outros rumos de pesquisa, para o esclarecimento maior, mais completo, que contribua para independência nacional.
É como concluo estas reflexões.
*Pedro Augusto Pinho, avô, administrador aposentado (janeiro de 2019)