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domingo, 30 de junho de 2019

#EleNão: Mulheres, mais uma vez, alavancam a rejeição a Bolsonaro

Uma maioria cada vez mais ampla de brasileiras rejeita Bolsonaro e seu governo
 Por André Cintra

Uma maioria cada vez mais ampla de brasileiras rejeita Bolsonaro e seu governo

Pela primeira vez desde a posse do presidente, o percentual de brasileiros que reprovam sua gestão alcançou, numericamente, o índice de pessoas que a aprovam. Em abril, 35% dos brasileiros avaliavam o governo Bolsonaro como “ótimo” ou “bom”, enquanto 27% o consideravam “ruim” ou “péssimo”. 

Agora, esses dois polos – os pró-Bolsonaro e os anti-Bolsonaro – estão rigorosamente empatados: 32% a 32%. O Ibope ouviu 2 mil pessoas, em 126 municípios brasileiros, entre 20 e 23 de junho. A margem de erro é de dois pontos percentuais (para mais ou para menos).

No relatório em que apresenta os números do instituto, a Confederação Nacional da Indústria (CNI), contratante da pesquisa, informa que o aumento da insatisfação com o governo foi maior em quatro segmentos: “entre as mulheres, entre os respondentes com até a quarta série da educação fundamental, entre os brasileiros com menor renda familiar e entre os residentes nas regiões Norte/Centro-Oeste e Nordeste”. 

O texto agrega que as oscilações se devem, acima de tudo, “à redução do percentual dos indecisos, ou seja, aqueles que [em pesquisas anteriores] não souberam ou não quiseram responder”. Os brasileiros que deram um tempo – ou uma trégua – a Bolsonaro, à espera de suas primeiras medidas, tendem agora a desaprovar a gestão. Praticamente não há estrato em que a popularidade de Bolsonaro tenha crescido, com a notória exceção da região Sul.
Homens e mulheres

Mas nenhum recorte chama mais atenção na sondagem da CNI/Ibope do que o fator gênero. Embora a “aprovação da maneira de governar” e a “confiança no presidente” tenha caído tanto entre os homens quanto entre as mulheres, os números de uma e outra faixa são muito distintos.

No universo masculino, o apoio a Bolsonaro ainda é elevado e majoritário. Em junho, segundo a pesquisa, “54% dos homens aprovam a maneira de governar do presidente e 42% desaprovam”. Os índices se assemelham quando se trata da confiança dos brasileiros do sexo masculino no presidente: 54% deles confiam, 44% desconfiam. 

Já no estrato feminino, as inclinações se invertem. Uma maioria cada vez mais ampla de brasileiras rejeita Bolsonaro e seu governo, numa tendência similar à que houve em setembro e outubro do ano passado, na reta final das eleições presidenciais. Hoje, entre as mulheres, a gestão Bolsonaro nutre bem mais reprovação (54%) do que aprovação (39%). Da mesma maneira, 57% das mulheres desconfiam do presidente, ao passo que 39% confiam. 

Possíveis causas

É fato que, em outubro passado, eleitores e eleitoras já não tinham votado de maneira simétrica para presidente – especialmente no segundo turno. Ainda assim, o Ibope nos deve uma explicação mais científica: afinal, se em quase todos os segmentos a rejeição a Bolsonaro é crescente, por que são as mulheres que, uma vez mais, impulsionam esse movimento? À falta de uma resposta oficial, tentemos cruzar outros recortes da pesquisa e especular algumas causas. 

Desde janeiro, o Ibope tem medido a avaliação da gestão Bolsonaro em nove áreas com forte protagonismo do governo federal: combate à fome e à pobreza; combate à inflação; combate ao desemprego; educação; impostos; meio ambiente; saúde, segurança pública; e taxa de juros. Historicamente, as mulheres são mais sensíveis às chamadas “áreas sociais”, como educação e saúde. Foi justamente aí que Bolsonaro mais perdeu apoio e confiança no período de abril a junho.
 
O caso da educação ilustra a reviravolta. Há dois meses, tratava-se da área com a segunda melhor avaliação popular entre as nove analisadas pelo Ibope. Porém, com o anúncio de corte de verbas nas universidades por razões ideológicas – e com as constantes ameaças de perseguição a professores e alunos –, a rejeição à política educacional do governo saltou de 44% para 54% nestes dois meses. É provável que a fanfarronice do ministro Abraham Weintraub, no cargo desde 8 de abril, tenha ajudado a atrair ainda mais holofotes para os retrocessos anunciados pelo MEC.

Em mais três áreas, as taxas de desaprovação cresceram acima da margem de erro e superam, em muitos pontos percentuais, os índices de aprovação: no combate ao desemprego (55% rejeitam as ações do governo, 41% apoiam), na Saúde (56% de desaprovação, 40% de aprovação) e nos impostos (61% contrários, 33% favoráveis). 

A força dos protestos

É preciso considerar também que, entre a penúltima e a última pesquisa, a gestão Bolsonaro foi alvo de massivos protestos, com bandeiras como a defesa da aposentadoria e da educação pública. Do 1º de Maio Unificado à Greve Geral de 14 de junho, passando por duas grandes manifestações contra cortes na educação (em 15 e 30 de maio), centenas de milhares de brasileiros saíram às ruas ou paralisaram suas atividades para denunciar os desmandos do governo. 

Em que medida esses atos teriam “furado” a bolha dos movimentos sindical, social e estudantil, atingindo mais camadas da população? Os números do Ibope sugerem que os protestos surtiram, sim, efeito na avaliação do presidente e do governo. E sugerem, ainda, que esse efeito foi mais acentuado entre as mulheres. Evidência disso é a percepção dos brasileiros a respeito do noticiário envolvendo o governo, conforme frisa o instituto:

Os temas mais lembrados pela população são a reforma da previdência, o decreto sobre a posse/porte de arma, a divulgação da troca de mensagens entre os procuradores da força tarefa da Lava-Jato e o Ministro Sérgio Moro e as manifestações populares.

A reforma da previdência segue como uma das ações do governo mais lembradas pela população. Ela é citada de forma geral por 13% dos entrevistados e 1% cita notícias sobre alterações realizadas pela Comissão Especial. Os cortes/contingenciamentos de verbas na área de educação foram mencionados por 4% dos brasileiros.

É possível presumir, assim, que os temas das manifestações contra Bolsonaro – bem como a própria realização dos protestos – estão presentes e foram reforçados junto à opinião pública. A reforma da Previdência prejudica as mulheres em geral (por exemplo, com o aumento da idade mínima para a aposentadoria) e categorias majoritariamente femininas em particular (como o professorado e o funcionalismo público). Já nas mobilizações pela educação, a presença feminina prevaleceu, por meio de professoras, estudantes, mães de alunos e apoiadoras.
 
A crer na nova rodada da pesquisa CNI/Ibope, vivemos, de forma não planejada, uma espécie de renascimento silencioso do #EleNão. Tudo indica que as mulheres são, novamente, a força motriz da nova onda contra o bolsonarismo.

Fonte: Portal VERMELHO

"Moro viola sempre o sistema acusatório e é tolerado"


Sergio Moro sai de encontro com Jair Bolsonaro no dia 1º de novembro de 2018 na casa do recém-eleito presidente, no Rio de Janeiro.
Fotos: Mauro Pimentel/AFP/Getty Images
  1. Leia abaixo íntegra da reportagem publicada na noite desta sexta-feira (28):

Em mais uma parte da divulgação das mensagens secretas da Lava Jato, o site The Intercept divulga conversas entre procuradores que reclamavam de violações éticas do então juiz Sérgio Moro e temiam que a operação perdesse a "credibilidade" com a aproximação dele com Jair Bolsonaro. Em um dos diálogos, a procuradora revela "Moro viola sempre o sistema acusatório". 

Procuradores do Ministério Público Federal, em mensagens privadas trocadas em grupos com integrantes da Lava Jato, criticaram Sergio Moro duramente pelo que consideraram uma agenda pessoal e política do juiz. Eles foram além no decorrer e logo depois da campanha eleitoral de 2018: para os procuradores, Moro infringia sistematicamente os limites da magistratura para alcançar o que queria.

“Moro viola sempre o sistema acusatório e é tolerado por seus resultados”, disse a procuradora Monique Cheker em 1º de novembro, uma hora antes de o ex-juiz anunciar ter aceito o convite de Jair Bolsonaro para se tornar ministro da Justiça. Integrantes da força-tarefa da Lava Jato lamentavam que, ao aceitar o cargo (algo que ele havia prometido jamais fazer), Moro colocou em eterna dúvida a legitimidade e o legado da operação. Os óbvios questionamentos éticos envolvidos na ida do juiz ao ministério poderiam, afinal, dar maior credibilidade às alegações de que a Lava Jato teria motivações políticas.
Eu topo

Uma vez que o alinhamento de Moro com o bolsonarismo se tornou claro, até os maiores apoiadores do ex-juiz dentro da Lava Jato passaram a expressar um descontentamento antigo com as transgressões dele. Mesmo o coordenador da força-tarefa, Deltan Dallagnol (que sempre defendeu Moro), e o decano do grupo, Carlos Fernando dos Santos Lima, íntimo do então juiz, confessaram preferir que ele não aderisse ao governo Bolsonaro.


Um dia antes do anúncio de Moro, em 31 de outubro, quando circulavam fortes boatos de que Moro participaria do governo Bolsonaro, a procuradora Jerusa Viecili, integrante da força-tarefa em Curitiba, escreveu no grupo Filhos do Januario 3: “Acho péssimo. Só dá ênfase às alegações de parcialidade e partidarismo.”

A procuradora Laura Tessler, também da força-tarefa, concordou com a avaliação: “Tb acho péssimo. MJ nem pensar… além de ele não ter poder para fazer mudanças positivas, vai queimar a LJ. Já tem gente falando que isso mostraria a parcialidade dele ao julgar o PT. E o discurso vai pegar. Péssimo. E Bozo é muito mal visto… se juntar a ele vai queimar o Moro.” Viecili completou: “E queimando o moro queima a LJ”. Outro procurador da operação, Antônio Carlos Welter, enfatizou que a postura de Moro era “incompatível com a de Juiz”:

31 de outubro de 2018 – Filhos do Januario 3

Isabel Groba – 09:24:41 – É o fim ir se encontrar com Bolsonaro e semana que vem ir interrogar o Lula.
Jerusa Viecili – 09:25:20 – Concordo com tudo, Isabel!
Laura Tessler – 09:25:27 – Tb!
Laura Tessler – 09:26:01 – Pelo amor de Deus!!!! Alguém fala pro Moro não ir encontrar Bolsonaro!!!
Antônio Carlos Welter – 09:44:35 – Deltan Min do STF é um cargo no judiciário, que seria o reconhecimento máximo na carreira. Como ministro da justiça vai ter que explicar todos os arroubos do presidente, vai ter que engolir muito sapo e ainda vai ser profundamente criticado por isso. Veja que um dos fundamentos do pedido feito ao comitê da Onu para anular o processo do Lula é justamente o de falta de parcialidade do juiz. E logo após as eleições ele é convidado para ser Ministro. Se aceitar vai confirmar para muitos a teoria da conspiração. Vai ser um prato cheio. As vezes, o convite, ainda que possa representar reconhecimento (merecido), vai significar para muita gente boa e imparcial, que nos apoia, sem falar da imprensa e o PT, uma virada de mesa, de postura, incompatível com a de Juiz.

No dia seguinte, 1º de novembro, quando ficou claro que Moro seria anunciado como ministro da Justiça, outros procuradores do MPF não envolvidos com a Lava Jato aderiram ao coro. Conversando no grupo BD, do qual faziam parte procuradores de vários estados, eles dispararam duras críticas ao ex-juiz:

1º de novembro de 2018 – BD

Ângelo – 10:00:07 – Cara, eu não confio no Moro, não. Em breve vamos nos receber cota de delegado mandando acrescentar fatos à denúncia. E, se não cumprirmos, o próprio juiz resolve. Rs.
Monique – 10:00:30 – Olha, penso igual.
Monique – 10:01:36 – Moro é inquisitivo, só manda para o MP quando quer corroborar suas ideias, decide sem pedido do MP (variasssss vezes) e respeitosamente o MPF do PR sempre tolerou isso pelos ótimos resultados alcançados pela lava jato
Ângelo – 10:02:13 – Ele nos vê como “mal constitucionalmente necessário”, um desperdício de dinheiro.
Monique – 10:02:30 – Se depender dele, seremos ignorados.
Ângelo – 10:03:02 – Afinal, se já tem juiz, por que outro sujeito processual com as mesmas garantias e a mesma independência? Duplicação inútil. E ainda podendo encher o saco.
Monique – 10:03:43 – E essa fama do Moro é antiga. Desde que eu estava no Paraná, em 2008, ele já atuava assim. Alguns colegas do MPF do PR diziam que gostavam da pro atividade dele, que inclusive aprendiam com isso.
Ângelo – 10:04:30 – Fez umas tabelinhas lá, absolvendo aqui para a gente recorrer ali, mas na investigação criminal – a única coisa que interessa -, opa, a dupla polícia/ juiz eh senhora.
Monique – 10:04:31 – Moro viola sempre o sistema acusatório e é tolerado por seus resultados.

É particularmente significativo que procuradores tenham chamado algumas absolvições de Moro de “tabelinhas” – destinadas a criar uma falsa percepção de imparcialidade –, já que as absolvições haviam sido citadas pelo ex-juiz e por Deltan Dallagnol justamente para refutar acusações de que Moro era o verdadeiro chefe dos procuradores.

Quando Moro foi finalmente confirmado como ministro da Justiça, o procurador Sérgio Luiz Pinel Dias, que atua na Lava Jato no Rio de Janeiro, digitou no grupo MPF GILMAR MENDES que, daquele momento em diante, seria muito difícil “afastar a imagem de que a LJ integrou o governo de Bolsonaro”:

1º de novembro de 2018 – Grupo MPF GILMAR MENDES

Thaméa Danelon – 10:19:01 – Bom dia pessoal. Qual a opinião de vcs sobre Moro no MJ?
José Augusto Simões Vagos – 10:44:57 – Acho inoportuno
Sérgio Luiz Pinel Dias – 10:50:51 – Thamea e colegas, pessoalmente acho ruim para o legado da LJ, por melhor que sejam as intenções dele de tentar influir por dentro. . . . Para mim, LJ, além de ser um símbolo, é um método de atuação das nossas instituições, que nos permitiu, até aqui, surfar juntos em uma excelente onda. Mas será difícil, muito difícil, hoje e provavelmente no futuro, com a assunção de Moro ao MJ, afastar a imagem de que a LJ integrou o governo de Bolsonaro. Vejo, por esse motivo, com muita preocupação esse passo do Moro.
Mônica Campos de Ré – 10:54:12 – Concordo!

A procuradora Isabel Cristina Groba Vieira, da Lava Jato em Curitiba, opinou no grupo Filhos do Januario 3: “É realmente péssimo. O nome da LJ não pode ser conspurcado.”

"Erro Crasso"

As críticas a Moro vinham se acumulando desde muito antes do anúncio oficial de que ele seria empregado de um presidente de trajetória marcada por apologia à tortura, à ditadura e a declarações misóginas e homofóbicas. A três dias do segundo turno das eleições, em 25 de outubro, os procuradores Jerusa Viecili e Paulo Roberto Galvão lamentaram que Moro e que a própria força-tarefa passassem a impressão de favorecer a candidatura de Bolsonaro.

Galvão se mostrava especialmente preocupado com o silêncio da força-tarefa em relação às declarações do político contra a liberdade de imprensa e ao seu desprezo pelo devido processo legal. Essas posições eram criticadas pela Lava Jato quando verbalizadas por outros políticos. Galvão se incomodava também com o silêncio dos colegas frente aos ataques dirigidos contra os protestos anti-Bolsonaro que ocorriam em universidades, assim como Jerusa Viecili:

25 de outubro de 2018 – grupo Filhos do Januário 3

Jerusa Viecili – 14:45:52 – Pessoal, desculpem voltar ao assunto (sou voto vencido), mas, somente esta semana, várias pessoas, inclusive alguns colegas e servidores, me questionaram a ausência de manifestação da FT diante de alguns posicionamentos dos candidatos à presidência. Fato é que sempre nos posicionamos diante de várias ameaças ao nosso trabalho e, nos últimos dias, temos ficado silentes, mesmo com ameaças de candidatos à independência do Ministério Público (nomeação de PGR fora da lista tríplice) e à liberdade de imprensa. Em outros tempos, por motivos outros, mas igualmente relevantes e perigosos, divulgamos nota, convocamos coletiva e ameaçamos renunciar (!). Agora, jornalistas escrevem no Twitter que a LAVA JATO é caso de desaparecido político, pois já alcançou o que queria. Acho muito grave ficarmos em silêncio quando um dos candidatos manifesta-se contra a nomeação do PGR da lista tríplice, diante de questões ideológicas. Mais grave ainda, assistirmos passivamente, ameaças à liberdade de imprensa quando nós somos os primeiros a afirmar a importância da imprensa para o sucesso da Lava Jato. Igualmente grave, candidatos divulgarem nomes de futuros ministros que são alvos de investigações e processos por corrupção. Nossa omissão também tem peso e influência. Eu sinceramente não quero (e isso a penas a história dirá) que a Lava Jato seja vista, no futuro, como perseguição ao PT e, muito menos, como co-responsável pelos acontecimentos eleitorais de 2018. . . .

Três horas depois, o procurador Paulo Roberto Galvão disse no mesmo grupo: “Pessoal, nós somos procuradores da República. Cumprimos a nossa função no combate à corrupção, e não poderíamos ter feito diferente, ainda que soubéssemos que daí poderia advir um eleito antidemocrático (e sabíamos pois estudamos e conhecíamos o risco Berlusconi)”. Para ele, a força-tarefa não poderia ser acusada de ter tentando influenciar as eleições presidenciais, porque só fez o seu trabalho. “Infelizmente, Moro indiretamente e Carlos Fernando diretamente erraram ao deixar transparecer preferência (o primeiro) ou dizer abertamente de sua preferência (o segundo)”, ponderou.

Um dia depois, Jerusa Viecili insistiu no assunto: “Já desvirtuam o que falamos contra a corrupção ser a favor do Bolsonaro. mas não vou mais insistir. o fato é que a FT sempre comentou tudo (desde busca e apreensão em favela, lei de abuso de autoridade, anistia, indulto, panelinha, etc …) e agora não comenta independencia do MP, liberdade de imprensa e BA em universidade”.

Moro assume, as reclamações aumentam

Sergio Moro encontra Jair Bolsonaro no dia 1º de novembro de 2018 na casa do recém-eleito presidente, no Rio de Janeiro.


Na noite do segundo turno, antes de ser anunciado o resultado, procuradores da Lava Jato e outros membros do MPF se mostraram irritados no grupo BD com a esposa de Moro. Mesmo depois de o ex-juiz já ter “cumpriment[ado] o eleito”, Rosângela comemorou explicitamente a vitória de Bolsonaro em suas redes sociais:

28 de outubro de 2018 – grupo BD

Alan Mansur PRPA – 20:21:05 – Esposa de Moro comemorando a vitória de Bolso nas redes
José Robalinho Cavalcanti – 20:21:29 – Erro crasso.
José Robalinho Cavalcanti – 20:22:09 – Compromete moro. E muito
Janice Agostinho Barreto Ascari – 20:25:30 – Moro já cumprimentou o eleito. Como perde a chance de ficar de boa, pqp
Luiz Fernando Lessa – 20:25:56 – esse povo do interior
Luiz Fernando Lessa – 20:26:02 – é muito simplório


Confirmada a vitória de Bolsonaro, o procurador Luiz Fernando Lessa ironizou a ânsia de Moro em fazer parte do governo. Ainda no grupo BD, ele se dirigiu ao então presidente da Associação Nacional de Procuradores da República, José Robalinho Cavalcanti: “Robalinho, já tem lugar na posse, do lado do Mourão? Com as tuas medalhas?”

As críticas à parcialidade e ao partidarismo do juiz foram se intensificando à medida que a especulação acerca de um cargo para Moro no governo Bolsonaro aumentava. Comentando uma postagem do site O Antagonista, que tratava de uma suposta intenção de Bolsonaro de nomear Moro ao STF e integrar a força-tarefa ao governo sob um “conselhão” a ser presidido por Deltan Dallagnol, o procurador Paulo Galvão reclamou no grupo Filhos do Januario 3: “impressionante como toda vez que moro fala fora dos autos fala bobagem.” Quando Laura Tessler respondeu com uma defesa moderada de Moro (“Ele quis estancar os boatos, mas sem fechar as portas”), Jerusa Viecili respondeu: “o ‘sem fechar as portas’ é que é perigoso para um juiz.”

No dia 31 de outubro, véspera do anúncio, a preocupação dos procuradores deu lugar à raiva e até pânico quando foi postado no grupo Winter is Coming um artigo de O Globo com a notícia que Moro viajaria ao Rio de Janeiro para um encontro com Bolsonaro na casa do presidente recém-eleito. Enquanto o sempre leal Deltan defendia Moro sozinho, os outros procuradores manifestavam sua indignação:

31 de outubro de 2018 – Winter is Coming

Janice Ascari – 08:06:11 – Moro se perdeu na vaidade. Que pena.
João Carlos de Carvalho Rocha – 08:10:31 – Ele se perdeu e pode levar a Lava Jato junto. Com essa adesão ao governo eleito toda a operação fica com cara de “República do Galeão”, uma das primeiras erupções do moralismo redentorista na política brasileira e que plantou as sementes para o que veio dez anos depois.


Às 9h36, Ascari completaria, no mesmo grupo: “Se Moro topar ser MJ, para mim será a sinalização de estar de olho na próxima campanha presidencial.”
Simultaneamente, o assunto mobilizava o grupo Filhos do Januario 3.


31 de outubro de 2018 – Filhos do Januario 3

Jerusa Viecili – 08:48:20 – Espero que não seja verdade 
Jerusa Viecili – 08:48:20 – https://glo.bo/2JrHJrR
Deltan Dallagnol – 08:51:47 – Ótima decisão pras leniências tb
Deltan Dallagnol – 08:52:47 – Ele vai checar lá. Ficou 1 ano sozinho. Acho que pessoal será sensível, mas veremos
Deltan Dallagnol – 08:54:16 – Acho que não vai converter nem desconverter ng do que já acha sobre a LJ, nesse ponto
Jerusa Viecili – 08:55:38 – Não é sobre converter as pessoas. É sobre preservar a LJ.
Laura Tessler – 08:57:25 – Tb acho péssimo. MJ nem pensar… além de ele não ter poder para fazer mudanças positivas, vai queimar a LJ. Já tem gente falando que isso mostraria a parcialidade dele ao julgar o PT. E o discurso vai pegar. Péssimo. E Bozo é muito mal visto… se juntar a ele vai queimar o Moro
Jerusa Viecili – 08:59:58 – E queimando o moro queima a LJ
Isabel Groba – 09:18:58 – É realmente péssimo. O nome da LJ não pode ser conspurcado.
Andrey Mendonça – 09:19:27 – Para ministro do stf, acho otimo. Para ministro da justiça acho que vai dar azo – com razão – a argumentos de politização da lava jato.
Andrey Mendonça – 09:20:24 – Lembro de um promotor italiano em um artigo q falava sobre maos limpas. Terminava dizendo: e nunca entrem na política

Isabel Groba – 09:22:30 – Isso! E pra ser Ministro do STF precisa abrir vaga. Então, ainda que em futuro próximo, isso ficaria para um momento posterior. E, depois, como Ministro pode rechaçar medidas reacionárias que venham.
Isabel Groba – 09:23:17 – Como Ministro do STF


À medida que apareciam na imprensa as notícias de que Moro estava negociando com Bolsonaro um superministério com poderes expandidos, o procurador Ângelo Augusto Costa chamou a atenção do grupo BD para o precedente perigoso que estava sendo criado: “Não eh muita coisa? Acho que o próprio Bolsonaro vai ficar com medo. Rs. Isso sem falar de quem vem depois. Moro, ok, mas nada eh eterno. Esse super MJ pode virar uma máquina de perseguição política.”

Mesmo os poucos defensores que o juiz ainda tinha passaram a admitir o que era antes impensável assim que a notícia de que ele havia aceitado o ministério se espalhou: as constantes reclamações do PT – de perseguição por parte da Lava Jato e de partidarismo e motivação política por parte de Moro – ganhariam credibilidade, e que todo o trabalho da Lava Jato seria contaminado pela aventura política de Moro:

1º de novembro de 2018 – grupo BD
Monique Cheker – 10:50:46 – Um general da ativa não teria “argumento de autoridade” para atropelar o sistema acusatório. Moro fará com diploma em Harvard e com o nome da lava jato.
Monique Cheker – 10:51:23 – Mas concordo com a fala de Robalinho de que já passamos coisas piores
Janice Ascari – 10:55:15 – Moro aceitou
Janice Ascari – 10:55:19 – https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/moro-aceita-ministerio/?utm_source=twitter:newsfeed&utm_medium=social-organic&utm_campaign=redes-sociais:112018:e&utm_content=:::&utm_term=
Luiza – 10:56:16 – Moro aceitou
Alan Mansur – 10:57:25 – GloboNews diz que Moro aceitou e fará uma nota daqui a pouco
Monique Cheker – 11:00:03 – Pessoal da AGU surtando…
Monique Cheker – 11:00:03 – “@onyxlorenzoni Deputado. A AGU é função essencial à Justiça prevista na CF. Não precisa ser vinculada a nenhum ministério. @jairbolsonaro”
Monique Cheker – 11:00:03 – TT que estão espalhando 
Ângelo Augusto Costa – 11:00:39 – De alegria, né?
Ângelo Augusto Costa – 11:00:51 – Próximo passo eh lista tríplice
Alan Mansur – 11:00:56 – Tem toda a técnica e conhecimento para ser um excelente ministro da Justiça. E tentar colocar em prática tudo que ele acredita. Porém, o fato de ter aceitado, neste momento, entrar na política e desta forma, é muito ruim pra imagem de imparcialidade do sistema de justiça e MP em geral.
Alan Mansur – 11:01:59 – Será ainda mais marcado por parcialidade. E sempre ficará o comentário, Moro fez tudo isso para assumir o poder.
Alan Mansur – 11:02:46 – Pelo lado da técnica, ele será um excelente Ministro e acho que vai ajudar em muito a organização do sistema. Mas teremos que lidar com esta crítica constante

Minutos depois, os procuradores do grupo BD começaram a se preocupar em como a nomeação de Moro serviria de munição para o PT contra a Lava Jato. “Acho que o PT deve estar em festa agora, para justificar todo o discurso deles”, escreveu Alan Mansur. Peterson de Paula Pereira, procurador da República no Distrito Federal, disse que a decisão de Moro mostrava como ele atuava contra o ex-presidente Lula: “Fica claro que ele tinha Lula como troféu”. Para Monique Cheker, o movimento do ex-juiz passava uma imagem de que ele estava fazendo uma “escadinha” política com a Lava Jato:

1º de novembro de 2018 – grupo BD
Monique Cheker – 11:27:01 – Diferente se fosse ao STF direto. Seria perfeito. Políticos precisam obedecer prazos de desincompatibilidade. Por que não juízes e membros do MP? O distanciamento é importante numa república. Não basta ser honesto, tem que parecer honesto. Enfim.
Alan Mansur 11:28:04 – [imagem não encontrada]
Monique Cheker – 11:28:23 – E a “escadinha” disso tudo foi terrível: Moro ajudou a derrubar a esquerda, sua esposa fez propaganda para Bolsonaro e ele agora assume um cargo político. Não podemos olhar isso e achar natural 


Em 6 de novembro, dias depois de Moro ter aceitado o convite, mesmo Deltan Dallagnol, o procurador mais leal a Moro, confessou estar preocupado com os danos causados à reputação e à credibilidade do trabalho realizado por cinco anos pela operação Lava Jato. Ele e a procuradora Janice Ascari concordaram em uma conversa entre os dois que a conduta de Moro gerava “uma preocupação sobre alegações de parcialidade que virão”. Mesmo assim, os dois continuariam a defendê-lo.

6 de novembro de 2018 – chat privado

Deltan Dallagnol – 11:50:41 – Jan, não sei qual sua posição sobre a saída do Moro pro MJ, mas temos uma preocupação sobre alegações de parcialidade que virão. Não acredito que tenham fundamento, mas tenho medo do corpo que isso possa tomar na opinião pública. Na minha perspectiva pessoal, hoje, Moro e LJ estão intimamente vinculados no imaginário social, então defender o Moro é defender a LJ e vice-versa. Ainda que eu tenha alguma ponderação pessoal sobre a saída dele, que fiz diretamente a ele, é algo que seria importante – se Vc concordar – defender… Quanto à delação do Palocci, tema em que podem entrar, expliquei essa questão na minha entrevista da Folha de umas semanas atrás, não sei se chegou a ver, então mando aqui… bjus

https://www1.folha.uol.com.br/poder/2018/10/deltan-dallagnol-critica-discurso-hipocrita-a-favor-da-lava-jato.shtml

Janice Ascari – 12:55:05 – Oi querido, nosso pensamento é convergente. Também me preocupo com esse aspecto da parcialidade dele, porque põe em dúvida, também, o trabalho do MPF. Pretendo, além de, claro, defender a LJ como sempre faço (até quando não concordo com algumas coisas rsrs), mostrar que o Ministério da Justiça tem muita coisa com que se preocupar além da LJ, que continuará com Moro ou sem Moro.

Num outro grupo integrado por procuradores e assessores de imprensa da força-tarefa no Paraná, um dos jornalistas revela que Carlos Fernando dos Santos Lima “torcia” para que Moro recusasse o convite do presidente de extrema-direita: “CF mesmo, disse estar torcendo pra ele não aceitar”. “Creio que o que eu tinha para falar, já está falado. Agora é rezar para que ele não aceite”, prosseguiu Santos Lima, de acordo com o relato de seu assessor.

Em resposta a nossos contatos, o porta-voz da força-tarefa da Lava Jato enviou o que já se tornou sua resposta padrão, evitando qualquer comentário sobre o conteúdo da reportagem e preferindo insinuar falsa e levianamente que as conversas podem não ser autênticas: “O trecho do material enviado à Força-Tarefa não permite constatar o contexto e a veracidade do conteúdo. Autoridades públicas foram alvo de ataque hacker criminoso, o que torna impossível aferir se houve edições no material alegadamente obtido. A Lava Jato é sustentada com base em provas robustas e em denúncias consistentes, analisadas e validadas por diferentes instâncias do Judiciário. Os integrantes da Força-Tarefa pautam suas ações pessoais e profissionais pela ética e pela legalidade.”

A procuradora Monique Cheker disse que “não tem registro da mensagem enviada e, portanto, não reconhece a suposta manifestação”. “A procuradora ainda afirma que são públicas e notórias as incontáveis manifestações de apoio à operação Lava Jato e ao então juiz Sérgio Moro”, acrescentou sua assessoria. O procurador regional da República Luiz Fernando Lessa esclareceu que, desde recentes ataques ao Telegram, não possui mais o aplicativo nem as mensagens trocadas por meio dele, de modo que não reconhece as mensagens. Demais procuradores que não fazem parte da força-tarefa foram procurados e não responderam até a publicação deste texto. Eventuais comentários serão publicados se forem enviados ao Intercept.

O Intercept publicou a primeira reportagem sobre a #VazaJato há menos de três semanas. Desde então, o trabalho jornalístico realizado pelo Intercept – bem como pela Folha de S.Paulo e pelo jornalista Reinaldo Azevedo, da BandNews – demonstrou de forma clara que Sergio Moro violou repetidamente as normas éticas da magistratura, não exercendo seu poder judicial “pautado pela ética e pela legalidade”, mas cometendo diversos desvios éticos e atropelando os procedimentos legais.

Ao passo que essas revelações chocaram boa parte dos brasileiros, a imagem que emerge das conversas é que, entre os procuradores, o comportamento antiético e politizado de Moro já era há muito conhecido. Quando ficou claro que os desvios de Moro poderiam causar prejuízos ao trabalho da força-tarefa, os procuradores passar a expressar suas críticas – ao menos quando pensavam estar falando de forma privada – de forma bastante clara, sincera e raivosa.

Correção em 29 de junho de 2019, 9h40

Devido a um erro de digitação, marcamos uma conversa do grupo BD como se ele tivesse ocorrido em 1º de novembro de 2019, quando, na verdade, a data era 1º de novembro de 2018. Isso já foi corrigido.

Correção: 29 de junho de 2019, 10h30

A primeira versão desse texto indicava que a procuradora Monique Checker atua no Ministério Público Federal em Barueri e Osasco, São Paulo. Na verdade, ela trabalha no Ministério Público Federal de Petrópolis, RJ. Isso já foi corrigido. 

Com informações The Intercept e Portal Vermelho