Levantamento
do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas (FGV
Social) aponta que pessoas de 15 a 19 anos foram as que tiveram o maior
recuo na renda entre 2015 e 2019, com uma queda de 24%, seguidas por
aquelas que tinham entre 20 e 24 anos, cujos rendimentos caíram 11%. Agora,
entre o primeiro e o segundo trimestre deste ano, esses grupos perderam 34,2% e
26% da renda, respectivamente.
A queda acentuada do
rendimento dos jovens é explicada pelo fato de eles serem os mais atingidos
pelo desemprego. No segundo trimestre, enquanto a taxa de desemprego no
País chegou a 13,3%, entre a população de 18 a 24 anos, ela alcançou 29,7%.
O desemprego é
historicamente mais alto entre os jovens. A questão é que essa distância entre
a média do País e a registrada entre eles aumentou na crise de 2015/2016, nunca
mais voltou ao patamar anterior e, na pandemia, disparou ainda mais.
Antes de 2015, a
diferença da taxa de desemprego entre a população brasileira em geral
e os jovens era de 8,3 pontos porcentuais. Em 2017, chegou a 14,2 pontos e, com
a recuperação – ainda que lenta – da economia em 2018 e 2019, passou a
diminuir. Mas a crise do coronavírus fez essa diferença alcançar 16,4
pontos porcentuais entre abril e junho de 2020. O problema é ainda maior quando
se considera o chamado efeito cicatriz, isto é, um efeito de longo prazo na
carreira dos jovens que entram no mercado de trabalho em meio a uma recessão .
O economista Lucas
Assis, da consultoria Tendências, lembra que, globalmente, os jovens já têm uma
dificuldade maior para se inserir no mercado devido a um problema
de “assimetria informacional”, isto é, faltam informações para os
empregadores sobre a produtividade de quem está no início da vida laboral.
“No Brasil, isso é
mais grave por causa da baixa escolaridade. Jovens tendem a ter menos anos de
estudo e concorrem com pessoas desempregadas de maior qualificação”, diz Assis.
Nordeste e segmentos
mais pobres têm índices maiores de desemprego
O cenário é mais
desolador para os jovens nordestinos e das classes mais pobres. A taxa de
desemprego entre a população de 18 a 24 anos no Nordeste ficou em
34,5% no segundo trimestre. Nas classes D e E, chegou a 41,3%.
Além de a situação
atual já ser bastante ruim, o futuro para o casal não é nada promissor.
Estimativas da consultoria Tendências apontam para um crescimento fraco
do Produto Interno Bruto (PIB) na próxima década, com uma média de
2,4% ao ano até 2029. O mercado de trabalho deverá responder de modo bastante
gradual a isso, com a taxa de desemprego em dois dígitos pelo menos até
2029, quando deverá alcançar 10,3% – hoje está em 13,8%.
“O desemprego vai
ficar mais alto no ano que vem, prevemos 15,7%, com pessoas que hoje estão fora
do mercado começando a procurar ocupação. Para o mercado de trabalho dos
jovens, não vislumbramos um cenário otimista”, diz Assis.
Se
o cenário previsto pela Tendências se concretizar, os jovens brasileiros terão
enfrentado, até o fim da próxima década, 15 anos de crise laboral, o que poderá
marcar toda a trajetória profissional deles. Estudos apontam que
as condições iniciais do mercado de trabalho podem interferir no salário e
no emprego dos jovens durante toda sua vida. Assim, quanto maior o desemprego
no começo da carreira, menor o rendimento futuro.
“O
jovem, quando sai da escola, precisa experimentar várias ocupações para saber
qual combina melhor com suas habilidades. Se entra no mercado de trabalho numa
recessão, ele não tem essa possibilidade de experimentar ou fica desmotivado,
perdendo conhecimento”, diz o economista Naercio Menezes Filho, professor
do Insper.
O
economista afirma ainda que estudos feitos na Inglaterra mostram
que recessões no início da carreira profissional também aumentam a
probabilidade de os jovens entrarem para o crime, além de reduzirem a
produtividade do país. “Ou ele pode começar no crime ou ir trabalhar como
entregador de aplicativo, que é o que tem hoje. Ele não vai alcançar a
produtividade que teria nem a satisfação pessoal. Vai se acomodar em um nível
mais baixo, com salário inferior. O país todo perde.”
O
economista Marcelo Neri, diretor do FGV Social, lembra que a crise dos anos
1980 no Brasil foi um dos fatores que levaram a taxa de criminalidade no País a
patamares mais altos nos 15 anos seguintes. Segundo ele, o “efeito
diploma” também pode perder sua eficácia. “Logo que alguém consegue um título,
o ganho de renda costuma ser maior. Se se perde essa janela de oportunidade por
causa da pandemia, é possível que não haja uma recuperação depois.”
Apesar
do quadro desanimador para o jovem, há um fator da pandemia que pode ajudar
essa faixa da população. A quarentena imposta pelo coronavírus
tem acelerado a transformação digital das empresas e os jovens têm
mais facilidade para lidar com essa nova economia. “Mesmo tendo sido mais
afetados pela crise, eles dispõe de instrumentos para tentar se inserir dentro
das novas tendências”, acrescenta Neri.
Fonte: Estadão
C/ vermelho.org.br